A MORTE DO ABACATEIRO

C. estava em casa vestido com trajes de quintal. De repente, uma ligação! “Olha, aconteceu isso, tá todo mundo aqui, vem pra cá.” A notícia era grave, urgente! Antes de sair, pensou: “Que tristeza!” Mas, por dever de ofício, vestiu-se para sair. Lá chegando, já estava a viatura da polícia com dois homens fardados, um dos quais fazia anotações em uma folha fixada em uma prancheta. Havia uma fita com as cores preta e amarela, sinal de que dali adiante ninguém poderia passar. Olhou nas proximidades, pequenos grupos de pessoas com olhares de espanto, silenciosas e apreensivas, pouco falavam. Estavam diante de uma tragédia! C. se aproximou dos policiais, se apresentou e fez perguntas a um deles, que indicou o outro que estava registrando a ocorrência. Este copiava dados de uma carteira de identidade. Ao redor, silêncio! C. supunha que o corpo estava dentro da casa. Dirigiu-se a duas mulheres e lamentando o ocorrido, fez perguntas. Não! O corpo estava preso a uma corda num galho do abacateiro, coberto por um lençol branco. Os pais estavam em estado de choque e haviam sido levados ao hospital em uma ambulância. C. conhecia ambos e manifestou sua tristeza pelo ocorrido. O policial disse que tinha a orientação para não dar informação alguma sobre casos como esse. C. disse que compreendia e se retirou. A cena era realmente chocante! Ocorrera pouco antes da hora do almoço, sem que ninguém testemunhasse. A decisão, se é que houve alguma, terá sido tomada em segredo absoluto, entre o si e o si mesmo, talvez movida por uma dor existencial insuportável! A tragédia, assim como o drama e a comédia, faz parte da história da humanidade em todos os tempos. Um ser humano é um infinito e, por isso, jamais será conhecido de modo absoluto, assim como ele próprio não se conhecerá, por, muitas vezes, ser estranho para si mesmo. Se não, como explicar a depressão que certamente não é provocada pelos indivíduos e sim ocorre neles, seja por problemas genéticos ou grandes questões existenciais muitas vezes sofridas em silêncio e no anonimato do cotidiano numa profunda dor íntima não compartilhada. C. percebeu o efeito do sentimento de horror nos rostos dos vizinhos, mas o que se pode fazer diante do fato consumado? Sentimentos aos pais, gente boa, trabalhadora! O tempo prossegue seu curso inexorável! O abacateiro foi abatido, para não servir de lembrança de uma cena tão triste. O padre apareceu mais tarde para benzer, purificar o local com água benta e afastar o medo do lugar. Enfim, o tempo continua a fluir. Mas, esse fato permanecerá por muito tempo na memória daqueles que, parentes, vizinhos e amigos se lembram de um personagem que saiu da cena cotidiana de repente, deixando apenas a dor de sua ausência. (C.R.)

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *