MARÍLIA MENDONÇA E A ALMA FEMININA
A morte prematura e trágica da cantora Marília Mendonça, e de outras quatro pessoas que se encontravam no mesmo voo, me deixou sem palavras, como em geral fico diante das mortes de tantas pessoas que me eram afetivamente íntimas ou desconhecidas. Tendo ao silêncio reverencial, respeitoso, e as imagens relativas aos mortos, não importam as causas.
Fiquei, imagino, como milhões de brasileiros, horas pensando no acontecido. Por isso nada escrevi nesse tempo. O que dizer?
Uma jovem de 26 anos, talentosa, voz possante, que começou a compor aos doze anos no auge de uma carreira brilhante, conseguiu interpretar com rara sensibilidade a alma querente de uma infinidade de pessoas traduzidas em letras e canto que sacudia a galera por todo o país.
O impacto da notícia se espalhou pelo mundo. Até mesmo o mais famoso jornal norte-americano, o The New York Times, a reconheceu como a “rainha da sofrência” e a considerou como precursora do “feminejo”, um movimento que trouxe vozes femininas para a música sertaneja.
“Sofrência” resulta da junção das palavras sofrimento e carência. De modo simples, pode ser ententida como a dor causada pela pessoa que se ama, uma espécie de dor de cotovelo. Afinal, quem não sofre por amor, não é mesmo?
Mas as vigorosas interpretações dela, com domínio de palco, eram alegres, razão por que, talvez, fizesse tanto sucesso. Afinal, as pessoas não devem sucumbir na lagoa do sofrimento; ao contrário, podem superar as dores e dar a volta por cima porque o amor pode dar certo exatamente por possibilitar que as pessoas se libertem da sujeição dos homens e sigam a vida que, como se vê, pode ser muito breve.
Marília estreou em 2014 e lançou sem primeiro disco em 2015. Um álbum ao vivo lhe rendeu um certificado triplo de platina por 240 mil cópias vendidas. “Infiel” foi a música mais tocada nas rádios brasileiras naquele ano.
Em 2019, conquistou o Grammy Latino e ficou famosa após traduzir as experiências das mulheres com relacionamentos fracassados em suas canções. O poder de suas letras preconizava que as mulheres rejeitassem relacionamentos abusivos protagonizados por personagens [masculinas] indiferentes ao sofrimento [das mulheres].
Nesta sexta-feira (5), quando as primeiras notícias de sua morte começaram a aparecer na grande imprensa e internet, imediatamente provocaram milhões de reações e postagens aflitas de tristeza, reveladoras de sua importância como artista com intensa identificação popular. Não é de se admirar: ela contava com 22 milhões de seguidores no Yutube e mais oito milhões de ouvintes mensais na plataforma Spotify.
Marília Mendonça, e seus quatro acompanhantes de viagem, morreu numa área rural de Piedade de Caratinga, quando o avião King Air se chochou cotra as rochas existentes numa cachoeira, a cerca de dois quilômetros do aeroporto de Caratinga, cidade em que apresentaria mais um dos seus shows com a presença de milhares de pessoas. (C.R.)