BELA E EXUBERANTE, IBIÚNA É NEGLIGENCIADA COMO POTÊNCIA TURÍSTICO-ECONÔMICA

encantadora

Tive a satisfação de ser um dos professores da primeira turma de formandos em Administração de Empresas da Faculdade Montessori de Ibiúna, ministrando o curso de comunicação. Lembro-me como se fosse hoje, quando propus aos alunos que apresentassem um trabalho focalizando o município como estância turística. Sugeri até, por exemplo, focalizasse a cidade do ponto de vista da limpeza e o tema atrevido “Visite Ibiúna, a cidade mais limpa do Brasil”.

Na realidade a verdade factual, isto é, o que se via era sujeira por toda a parte, de envergonhar mesmo. Quem passasse pela rodovia Bunjiro Nakao, na altura do bairro do Curral, podia ver a montanha de detritos do lixão que ali existia transbordando quase até a rodovia.

Queria que os alunos refletissem sobre essa triste realidade e o melhor trabalho seria entregue por uma comissão de alunos ao prefeito da cidade para que pudesse causar algum efeito prático em defesa do meio ambiente e a favor da promoção turística capaz de atrair visitantes e fortalecer a economia do município, incluindo a geração de empregos.

REAÇÃO ESTRONDOSA

Para minha surpresa, os alunos tiveram uma reação tão instantânea quanto estrondosa: não iriam fazer o trabalho, como não fizeram, porque não acreditavam tanto no prefeito quanto na possibilidade de ele se sensibilizar com o assunto. Ainda tentei convencê-los de que os cidadãos, sobretudo os jovens, são capazes de contribuir para mudar uma realidade adversa. Em vão. Eles simplesmente deixaram claro que não acreditam nos políticos e nos administradores públicos ibiunenses.

Passados os anos, vejo agora e me pergunto se eles não teriam razão para agir daquele modo. Ainda esta semana, vitrine online publicou uma foto enviada por um leitor mostrando o lixo transbordando de duas caçambas para a margem da estrada do Cupim. Mal a foto foi publicada na página da revista, começaram a surgir denúncias de lixo acumulado em dezenas de bairros ibiunenses. Publicamos, então, matéria exibindo a perplexidade da população. Extraoficialmente, ficamos sabendo que os caminhões coletores estavam quebrados, mas não recebemos nenhuma informação oficial da prefeitura (embora tivéssemos solicitado) confirmando esse fato. Em toda a Estrada da Cachoeira, por exemplo, não houve coleta na quinta-feira e todo o lixo deixado na estrada pelos munícipes foi espalhado pela chuva ou ficou remexido pelos cachorros. Perdão amados alunos!

PLANO DIRETOR DE TURISMO

Em maio do ano passado, a Prefeitura da Estância Turística de Ibiúna contratou a empresa Geobrasilis para elaborar o Plano Diretor de Turismo, a um custo ao redor de R$ 190 mil. O serviço incluía “estudos técnicos integrados, inventários turísticos, diagnósticos econômicos e sociais, planejamento estratégico e operacional”. Uma descrição pomposa, como se nota!

De acordo com os termos do contrato, o plano deveria ter sido entregue à Prefeitura no dia 20 de fevereiro deste ano (2016) e até o momento não houve uma única notícia a respeito, a não ser uma reunião realizada no auditório da Biblioteca Municipal, em que a representante da Geobrasilis fez um relato dos estudos. Nada mais.

Na época em que o contrato foi firmado era outro o secretário de Cultura e Turismo, atualmente o titular da pasta é Rafael de Cassia Cerqueira, homem que goza da confiança de Fábio Bello [embora tenham se desentendido há pouco tempo, o que levou Cerqueira a exonerar-se do cargo, mas logo voltar ao posto] e tampouco deu notícia sobre o assunto.

É oportuno lembrar que em outros governos também se fez inventário sobre o potencial turístico ibiunense [que é imenso pelas suas riquezas naturais] e nada foi feito. Ibiúna foi inclusa na categoria de “estância turística” há 16 anos, e em todo esse período nada fez, tanto do ponto de vista estruturaL quanto funcional, para merecer esse título. Um exemplo triste e frustrante é a famigerada ciclovia que atravessa governos como um mau exemplo de obra pública inacabada. Se se considerar que a rodovia Bunjiro Nakao será duplicada, nada impede que uma coisa conflite com a outra, isto é, a ciclovia surgir como obstáculo a ser removido.

Só para ficar em mais um exemplo: a rodoviária de Ibiúna continua causando vergonha tanto para seus usuários quanto para os turistas que vêm à cidade de ônibus. Diz-se que será reformada, mas não quando isso acontecerá. Concentrador de poder de modo absoluto, o prefeito Fábio Bello guarda essas informações em sua caixa de Pandora privada.Tanto a ciclovia quanto a rodoviária seriam, se merecessem, dois cartões postais da cidade. A construção de uma unidade policial numa quina do pátio da rodoviária é a coisa mais antiestética já vista do ponto de vista urbanístico e funcional.

TURISMO EMOCIONAL

Já que tivemos dezesseis anos perdidos no setor de turismo em Ibiúna, é preciso fazer alguma coisa para recuperar o tempo, ou “reconstruir”, verbo escolhido pelo atual prefeito para grafar seu governo, o que está ou foi malfeito. Como talvez isso demore, e a economia está nos deixando todos os cidadãos preocupados com desemprego, talvez devamos criar uma nova modalidade de turismo, ainda não explorada pelas estâncias brasileiras: o turismo emocional. Sim porque os turistas em todo o mundo vão atrás de viver novas emoções.

Exploraríamos, na verdade, o que temos para mostrar, não da natureza, mas das obras feitas pelos homens. Exemplo de roteiro: visitar a estação rodoviária de Ibiúna e verificar a solidez de sua estrutura, a sujeira engastada em toda a parte e as atrações diárias que se verificam por ali, as pessoas se aglomerando para pegar os coletivos; caminhar pela ciclovia, ao lado do famoso brejão onde nasce o rio Sorocaba, com sua ecobiologia exuberante, sentir sob os pés o piso reto sem nenhum perigo de tropeçar e cair ou torcer os pés, tomando cuidado para não cair no barranco [na altura do nº 3.100 da av. Antonio Falci]; ao passear pela avenida Vereador Benedito de Campos, que agora se tornou também área de zona azul com estacionamento pago, onde brota esgoto do chão e provoca um cheiro tão nauseabundo que até os ambulantes dali procuram se afastar; ou visitar a praça da Matriz e tentar descobrir quem é o personagem homenageado com um busto de bronze e que foi objeto de vandalismo e está ali ora mirando para uma direção dos pontos cardeais [exemplo de cultura e da nossa memória histórica e isso é turismo]. Uma passagem pelos banheiros públicos da cidade, tanto na rodoviária quanto na praça central seria igualmente emocionante e inesquecível. Antes de finalizar o roteiro, haveria uma passagem dentro do ônibus com ar condicionado pelos montes de lixo espalhados pelas estradas e que tanto têm aborrecido os moradores, mas que podem sensibilizar quem vem de fora. Isso também é um tipo de emoção.

Para concluir o passeio, à tarde, o prefeito receberia os visitantes para um chá das 5, servido com delicados petit four, no saguão do Paço Municipal e mostraria a todos, com justificado orgulho, dezenas de fotos que mostram obras de sua realização. Se, como música de fundo, se ouvisse Debussy, as lágrimas seriam inevitáveis. (C.R.)

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.