COSUMIDORA LEVA SUSTO NO SUPERMERCADO: “VOCÊ VIU O PREÇO DO ALHO?”

alho

Esse fato aconteceu hoje, domingo (24), em Ibiúna. O quilo do alho R$ 31,50; em outras cidades pode beirar ou passar dos R$ 40,00. Na verdade, esse é apenas um dos muitos sustos que os consumidores estão tendo todas as semanas nos supermercados de um país que perdeu a vergonha, o rumo, a direção, quando se viu atingido por uma onda de corrupção como jamais vista, mesmo que sempre tenha havido em nossa história. Deu no que deu, na mais completa desmoralização e estamos, sim, o povo, pagando o pato, o alho, o arroz, o feijão, o óleo, a carne, o combustível, o remédio…

“É impressionante a capacidade humana para suportar o sofrimento e o abuso por mais trágico que isso seja.” Tomo emprestada essa observação do antigo professor da Universidade de Harvard, Barrington Moore Jr, porque é muito adequada para ajudar a refletir sobre tanto a incompetência quanto a incúria de autoridades que fazem uso da má-fé como se estivessem comendo caviar ou sorvendo um vinho de milhares de reais a garrafa, sem nenhum pudor.

É sagaz e oportuna a pergunta que faz em seguida, considerando que o tema central de longo estudo que ele apresenta diz respeito à injustiça: “Se a capacidade de suportar o mau-trato  é tamanha, sob que condições e por que os seres humanos (os brasileiros, no caso) cessam de acomodar-se a ele?” Aqui o leitor atento deve observar ou interpretar o seguinte: o sofrimento e o mau-trato são impostos aos povos ao longo de toda a história, mas há momentos em que os povos reagem de alguma forma, por que terá sido ultrapassado o limite do suportável. O aumento da criminalidade, da insegurança, da violência, das doenças, principalmente mentais, é apenas um sinal reflexo.

E a reação sólida da população ou povo, se preferirem, é de natureza moral. Tento explicar: a moral, em sentido social amplo, é um “acordo” que os indivíduos em sociedade fazem exatamente por terem que viver em sociedade, com relativa estabilidade de convivência e respeito, a fim de evitar-se uma descarga de agressão caótica.  Esse fenômeno, visto na história, decorre de uma diversidade de frustrações, em que se incluem as restrições ou privações (para as camadas mais carentes da população) de toda ordem, especialmente a econômica.  Você é obrigado, para não ter comportamento criminal, a pagar um quilo de alho a R$ 31,20 ou R$ 40,00, conforme o local do comércio, um litro de leite sem lactose (para quem tem que evitar essa substância) a R$ 5,89 ou um quilo de feijão a R$ 6,19, pão de fôrma R$ 5,16, uma dúzia de ovos R$ 5,39, um pacote de biscoito  R$ 7,10 . Isso para não entrar na área de açougue e no preço da gasolina comum que logo, logo, chegará aos R$ 4,00, hoje R$ 3,699 (ou seja), R$ 3,70. Cotejando esse ambiente econômico com a perda de emprego [há hoje no Brasil mais de 10 milhões de pessoas desempregadas com tendência de aumento], que é a forma mais imediata de as empresas se protegerem das ameaças reais do mercado em retração com juros altos: cortar custos.

A pergunta do professor está de pé: até quando a sociedade brasileira suportará essa realidade injusta, imoral e tormentosa? E bem sabemos quem está mais pagando o pato, pois o sofrimento não é distribuído por igual e invariavelmente castiga os que se encontram em situações mais frágeis na base da pirâmide social.

Dilma, Lula, Temer, Cunha, Renan formam um quinteto simbólico do que aconteceu e acontece de pior no Brasil, sem olvidar a contribuição sinfônica do tucanato cujos sons estão no pano de fundo do atual cenário brasileiro. Se Dilma e Lula caíram em descrédito público vergonhoso, não há porque comemorar Temer, Cunha e Renan como cavaleiros da esperança, pois não o são. E os milagres, como se sabem, em geral são excepcionalidades.

Mas esse desejo oculto de toda a nação brasileira de ver esses problemas cruciais serem superados constitui uma força de notável poder. A inteligência, a capacidade para o pensamento lógico pode ser concentrado na busca dessa meta, desde que aconteça um mínimo sinal de uma atitude clara e decente, que permita trazer uma centelha de esperança vívida capaz de funcionar como um catalisador. O que fizeram até agora foi um trabalho destrutivo e vergonhoso, de roubar a dignidade do povo, praticar manobras amorais e sujas, com o dinheiro produzido pelo suor do povo. Está, portanto, mais do que na hora de saber qual deve ser o verdadeiro valor do alho e da vida no Brasil. O resto é empulhação de políticos sórdidos e empresários inescrupulosos.

Como não disse antes, digo agora: observaram o grau de maturidade psicológica, cultural e política dos deputados federais no memorável dia de votação de abertura do impeachment da presidente Dilma? Uau! (Carlos Rossini)

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Nota da Redação: O alho é uma erva originária da Ásia Central. É um condimento (tempero) que possui propriedades medicinais, especialmente analgésica (contra dor) e antisséptica (antibiótica). Fora da botânica, a expressão “não se devem misturar alhos com bugalhos” significa evitar confusão e ou não enganar. Aparentemente, todos devem incluir mais alho em suas refeições diárias, sobretudo as personalidades “estelares” do Palácio do Planalto e do Congresso Nacional. Para elas, naturalmente, o preço não fará a menor diferença. Ponham na conta do povo.

 

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.