CRÔNICA – A CHAMA QUENTE DE UMA LOUCA PAIXÃO DE CARNAVAL

Ouço o verso da poetisa portuguesa Florbela Espanca, na voz do cantor cearense Fagner: “Gosto de ti apaixonadamente/De ti, és a vitória, a salvação/De ti que me trouxeste pela mão/até o brilho desta chama quente.”

De repente irrompe na minha memória a primeira paixão de carnaval, loucura por que passei, pois ela existe e pode marcar para sempre na lembrança, emergindo de tempos em tempos, quando há um novo carnaval.

Confidencio: pirei de paixão intensa porque as mulheres que fizeram parte da minha vida despertaram em mim aquele amor intenso, a ponto de ofuscar minha razão, da qual abdiquei vencido pela emoção que inventou um relógio e um tempo novos.

A paixão surgiu repentina diante daquele rosto de mulher encantador, com seu perfume, seus lábios carmins e seus negros cabelos ondulados. Mulher, puro fascínio. Nossos corpos ficaram colados um no outro todas as noites de folia.

O devaneio a dois inventou outro mundo só nosso. Para mim ela era a ópera toda. Fomos Pierrô e Colombina, esta personagem sedutora da commedia dell’arte; aquele símbolo do homem ingênuo e romântico. Ambos vestidos com roupas coloridas, largas, pomposas.

Eunice entrou na minha vida sem avisar, no começo do carnaval, inesquecivelmente linda e me tomou para si, numa perfeita combinação química própria dos fluidos do amor.

De novo seus cabelos negros. Emolduravam-lhe o rosto como um desenho delicado. Recendiam um perfume levemente adocicado. Em cada um dos nossos encontros, parecia ter acabado de banhar-se e seu frescor embriagava-me ainda mais, era refrescante e relaxante como um barato, como diz a juventude.

Tínhamos a mesma altura e, suando em bicas no salão, nossas peles se colavam como nossos beijos ardentes.

Estava tomado por esse louco amor. Dia e noite ela estava em minha mente, dançando soberana na minha incontrolável imaginação. Eu dormia Eunice e acordava Eunice.

Agora mesmo, enquanto escrevo, sinto-a bem de mim, com a ternura cinzelada pelo tempo que passou. Se soubesse onde estaria hoje não iria encontrá-la para que se mantenha intacto aquele momento de pura magia.

Eunice, obrigado por ter me acompanhado na “chama quente” de um carnaval. Saiba que, por alguns momentos, nos salvamos pela maravilhosa fusão de nossa existência. Vivemos felizes por algumas horas e é essa a lembrança que guardo de você.

Quem vive uma paixão sabe que ela é fugaz e aprende que o amor é supremo êxtase e bem-estar indescritível, enquanto dura. Você é minha melhor recordação do carnaval.

 

Andrea Toscano

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.