Drogas dizimam cada vez mais jovens

“A sociedade brasileira não se dá conta de que sua juventude está sendo dizimada cada vez mais pelas drogas e violência a elas relacionada”, adverte o Dr. Anthony Wong, 63, diretor-médico do Ceatox – Centro de Assistência Toxicológica do Instituto da Criança do Hospital das Clinicas da USP.

Um dos mais destacados pediatra e toxicologista brasileiro, Dr. Wong representa a instituição que dirige no Programa de Segurança de Medicamentos da Organização Mundial da Saúde e é requisitada fonte de informações científicas da imprensa, quando o assunto em questão se refere às suas especialidades.

Nesta entrevista exclusiva para a Revista Vitrine, ele faz importantes revelações sobretudo para pais, dirigentes de escolas, professores e educadores de modo geral:

Revista Vitrine – Por que as pessoas procuram drogas?

Dr. Wong– Porque elas obtêm um momento de satisfação e prazer com o uso dessas substâncias, muitas vezes suprindo ou complementando uma necessidade do próprio corpo ou do seu psiquismo. Se a pessoa se sente infeliz, faz uso de um antidepressivo e fica alegre; se é agitada, fica calma; se é tímida passa a ter uma sensação de valentia ou se torna extrovertida.

Revista Vitrine – A humanidade sempre consumiu drogas?

Dr. Wong – Sem dúvida. As drogas sempre fizeram parte da humanidade. O homem das cavernas começou a mastigar ervas, que lhe suprimia a dor ou lhe transmitia uma sensação de euforia. A diferença e que eram consumidas por sacerdotes em cerimônias religiosas ou pelas classes dominantes, mas certamente sempre por adultos. Hoje, a droga é consumida por crianças de 9, 10 anos e jovens com menos de 18 anos. O risco para os menores se tornarem adictos (viciados) é grande. Antes dos 18 anos, quando o jovem usa drogas elas serão ‘percebidas’ como parte do corpo (organismo). Por isso, é mais fácil adquirir o vício. Após os 20 anos, o corpo já consegue distinguir a droga como corpo estranho. Outro agravante é a falta de maturidade psicológica para dizer não à droga. Quando mais cedo, mais propenso ao vício é o jovem.

Revista Vitrine – Como o senhor observa a conduta da sociedade?

Dr. Wong – A sociedade está cada vez mais relaxada em relação ao uso de drogas. Os jovens se sentem estimulados a se ‘esquentar’ e começam a beber antes de irem a festas, baladas, e depois, bebem mais. A sociedade protege, acoberta ou estimula  esse comportamento. Na medida em que os pais querem ser amigos dos filhos, em vez de usarem de disciplina passaram a ter medo dos seus filhos e perderam a autoridade para darem exemplo moral.

Revista Vitrine – As notícias sobre drogas chamam cada vez mais atenção.

Dr. Wong – A variedade de drogas aumentou muito. As mais consumidas são o álcool, a maconha e também as anfetaminas, remédios para emagrecer, tranquilizantes. No Brasil, 72% dos jovens com menos de 16 anos já tomaram um porre. Na faixa que vai até 18 anos, mais de 40% já fumaram maconha. Enquanto nos EUA e Europa os comércios que vendem bebidas a menores são fechados e até perdem a licença de funcionamento, no Brasil os bares constituem lugares livres para consumo de bebidas.

Revista Vitrine – O que é preciso fazer para combater essa situação?

Dr. Wong – Mudar a cabeça dos pais. Eles são a causa mais importante de recuperação dos filhos. As drogas estão no centro das causas de morte violenta de jovens no Brasil. Por ano, morrem mais jovens no Brasil em decorrência das drogas do que as mortes que ocorriam por ano na Guerra do Vietnã. Se os pais não agirem com firmeza, dando bom exemplo para os filhos, estes poderão ser as próximas personagens da violência e de doenças mentais causadas pelas drogas.

Revista Vitrine – O que as pessoas não podem deixar de saber sobre as drogas?

 Dr. Wong – As drogas crescem com uma violência sutil. Conhecer tudo sobre drogas é fundamental na escola e dentro de casa. As crianças devem receber o conhecimento a partir do momento em que ingressam no curso primário. Precisamos de um novo paradigma para lidar com as drogas na sociedade, pois o que sabemos até agora já não serve mais.

Revista Vitrine – Há luz no fim do túnel para quem percorre o caminho das drogas?

Dr. Wong – Se identificarmos precocemente o problema, o resultado é bom, as chances de recuperação é grande.

Revista Vitrine – O que fazer?

Dr. Wong – A realidade das drogas precisa de uma ação coordenada pela sociedade. O governo não pode resolver o problema, já que só pode atacar o tráfico. O povo brasileiro precisa indignar-se frente à situação, principalmente em relação às crianças. A questão é acabar com o consumo, que pode começar com cigarros e álcool, duas portas de entradas para as drogas pesadas.

 

Ceatox – Centro de Assistência Toxicológica do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo.
Av. Enéas de Carvalho Aguiar, 647, 3º andar – Jardim América. –SP.
Telefones: 11 3069-8571 – 11 3088-7645 – www.ceatox.org.br.

 

Entenda o que é

DROGA– Qualquer substância  (ácido lisérgico, cocaína, heroína, entre outras)que pode levar à dependência química, por exemplo, qualquer sustância ou produto tóxico (fumo, álcool, maconha) de uso excessivo; qualquer substância que leva a um estado satisfatório ou desejável.

TÓXICO – Que produz efeitos nocivos no organismo, que contém veneno.

VENENO– Qualquer subs-tância, preparada ou natural, que por sua atuação química é capaz de destruir ou perturbar as funções vitais de um organismo.

DEPENDÊNCIA FÍSICA– Fenômeno gerado pelo uso contínuo de certos medicamentos ou drogas que leva o corpo a produzir um novo equilíbrio, exigindo para seu funcionamento um aporte (uso) regular de tais medicamentos ou drogas, cuja falta pode gerar sintomas graves, inclusive morte.

DEPENDÊNCIA PSÍQUICA– Compulsão a consumir certos medicamentos ou drogas porque produzem um efeito agradável ou suprimem problemas como ansie-dade, depressão e outras.

COMPULSÃO– Imposição interna irresistível que leva o indivíduo a realizar determinado ato ou a comportar-se de determinada maneira, mesmo com risco de perda de valores.

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.