À BEIRA DA ITUPARARANGA

Foi hoje. Faz poucas horas.

Quando tirei o calçado, senti a terra seca, dura e áspera.

Desço a margem inclinada. Faz séculos que não ando descalço.

Já na parte úmida e mais funda do leito, daquele braço de águas desaparecidas, a sensação nas solas dos pés que se imprimem num misto de lama e areia, junto com as marcas deixadas pelos pássaros. Mais uns passos e já começo a atolar. Paro.

Então, cato o celular e roteirizo: começo a captar a imagem do céu azul, vou descendo ao encontro da terra passando, antes, pela vegetação que mescla o verde das árvores ao amarelo-ouro do mato sedento e ressequido pela falta de chuva. Caíram uns pingos outro dia para dar um refresco, mas duraram pouco seus efeitos. A seca voltou em seguida, sob o sol forte e abrasador em pleno inverno.

A câmera prossegue lenta e revela o leito despido do seu manto de água. Percorre como um olhar atônito pela paisagem em que parece faltar um complemento. Sim há uma sede imensa. À espera de um milagre. As margens extensas eram cobertas de água. Agora estão duras como granito, sem um caminhar leve podem lixar a pele desguarnecidas dos pés.

Do outro lado, nota-se: as águas continuam desaparecendo.

Tiro a camiseta. Deito-me com serenidade. Reverencio o lugar como algo sagrado. Abro os olhos e vejo o sol esplendoroso, quente, o céu azul sem nenhuma nuvem. A luz resplandece na atmosfera.

Fico ali algum tempo, o suficiente para sentir os raios do sol penetrarem fundo em minha pele. Percebo, por breves instantes, uma comunhão com o Todo. Sinto um profundo respeito pelo Cosmos do qual faz parte nosso azul e pequenino planeta perdido numa remota espiral muito distante do núcleo da Via Láctea.  (Carlos Rossini é editor de vitrine online)

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.

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