ITUPARARANGA – REPRESA PODE ‘MORRER’ POR FALTA OU MÁ QUALIDADE DE SUAS ÁGUAS

No dia 16 de junho de 2021, Daniele Frascareli conquistou o título de doutora em Ciências Ambientais ao defender a tese sobre uso e ocupação do solo e a qualidade dos sedimentos da represa Itupararanga [veja nota no rodapé] na Unesp-Sorocaba.

Isto aconteceu depois de acompanhar a vida da represa por cerca de dez anos e fazer estágio por um ano no Instituto Helmoltz-Magdeburg, na Alemanha, referência mundial nesse tipo de ensino, para complementar sua formação acadêmica, aprendendo diferentes procedimentos e técnicas para coleta e análises de amostras de água, solo e sedimentos de reservatórios.

A represa Itupararanga é responsável pelo abastecimento de 1 milhão de pessoas na região Sorocaba e se encontra numa situação qualificada de “gravíssima” por especialistas por dois motivos: suas águas estão prestes a atingir o volume morto e suas águas se encontram notoriamente poluídas por diversos tipos de resíduos.

Nesta entrevista, a dra. Daniele Frascareli, que também é engenheira ambiental, responde a diversas perguntas formuladas por vitrine online e lança novas luzes urgentemente desafiadoras para prefeitos municipais da região [incluindo Ibiúna, em cujo território se encontram 64% da superfície da represa], vereadores, empresas concessionárias de serviços de água e esgoto, Sabesp, Cetesb, DAEE, entidades de defesa do meio ambiente.

Vitrine online que acompanha a vida da represa Itupararanga há anos espera, com este trabalho, estar contribuindo para que situação crítica desse grande reservatório desperte também a atenção da população para que economize e faça uso racional da água.

Vitrine online – Você acompanha a vida da Itupararanga há quantos anos?

Daniele Frascareli – Acompanho a vida de Itupararanga desde 2011, quando iniciei o desenvolvimento do meu TCC na Unesp [Univrsidade Estadual Paulisa] de Sorocaba.

VO – Como está a represa neste momento, sob os pontos de vista de quantidade e qualidade de suas águas?

DF – Está deteriorando, principalmente em relação ao esgotamento doméstico. Observamos altos índices de trofia e um aumento ao longo do tempo.

VO – Do que é constituída as águas da represa, além da água propriamente dita? Nutrientes, agrotóxicos, bactérias, esgoto sem tratamento?

DF – Posso responder em relação ao que vim trabalhando: metais traço e nutrientes. temos trabalhos publicados em jornais internacionais que mostram os dados mais detalhados, resumidamente: fosforo e nitrogênio proveniente de esgotamento e também atividade agrícola do entorno. Em relação aos metais, encontramos valores de cobre acima da legislação Conama nos sedimentos superficiais da entrada do reservatório.

VO – O que compõe o leito da represa na situação atual?

DF – O leito dos sedimentos também apresenta nutrientes em excesso que é uma resposta das entradas externas (do uso e ocupação do entorno). Alguns eventos (naturais) podem favorecer a ressuspensão desses nutrientes e aumentar a trofia das águas (leia sobre eutrofização). Como falei na resposta da pergunta 3 também tem alguns metais, o que é prejudicial, principalmente nessa época de escassez e a possibilidade de se usar águas do volume morto (os metais podem ir junto).

VO – Ela poderá se tornar um pântano em menos de duas décadas, como declarou em matéria publicada por vitrine online com o biólogo Dr. André Cordeiro, que estuda a represa há mais de dez anos?

DF – Como o Dr. Cordeiro mencionou, e ele tem mais experiência em Itupararanga que eu, acredito que a retirada de água sem nenhum planejamento pode sim fazer com que o reservatório tenha níveis baixos de água, perigosos. Inviabilizando seu uso, com certeza!

VO – Na sua visão o que ocasionou a situação atual da represa?

DF – Retiradas de água sem considerar a reposição natural e os eventos da sazonalidade. Faltou planejamento principalmente por parte das grandes cidades.

VO – Como avalia a posição das autoridades em relação à represa, estão tendo uma visão realista e responsável ou estão tapando o sol com a peneira?

DF – As autoridades devem propor medidas de prevenção no começo da estiagem, educação ambiental, ações em jornais, fiscalização e muita conscientização da população. Veja, o uso primordial da água em época de escassez é abastecimento de água, ponto final. Se tem empresas utilizando em excesso ou alguma outra atividade (exemplo: agrícola) usando essa água sem a mesma conscientização, a prefeitura deve agir, ministério público, etc. Não adianta só a população fazer o sacrifício, mas já ajuda. Os órgãos ambientais devem ficar atentos na fiscalização das outorgas de água, uma vez que o que acontece em Itupararanga todo ano, não deve ser normalizado.

VO – Qual a tendência do futuro da represa?

DF – Itupararanga ser inviabilizada em relação à qualidade da água. Nutrientes e metais em excesso podem inviabilizar o uso da água e isso deve ser prioridade na gestão das águas. 100% de coleta e tratamento de esgoto já ajudaria muito, controle do uso e ocupação da terra do entorno e das atividades, proteção das matas ciliares e também restauração das que foram suprimidas. Bom, no meu ver ter muitas atividades importantes que ajudariam a contém a deterioração em relação a qualidade. Fica aqui a minha breve visão a respeito do momento que estamos agora. Muito poderia ter sido feito, mas não foi, cá estamos.

DADOS SOBRE A TESE

Daniele: metais e nutrientes podem inviabilizar o uso das águas da Itupararanga

No dia 16 de junho de 2021 foi apresentada a Tese intitulada “Heterogeneidade Espacial e Influência do uso e ocupação do solo nas características do sedimento superficial e água intersticial no reservatório de Itupararanga – SP” pela discente Daniele Frascareli do programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais da Unesp-Sorocaba. A sessão de defesa foi presidida pelo Prof. Dr. André Henrique Rosa (Unesp-Sorocaba, orientador de Daniele), pelo Prof. Dr. Kurt Friese (Instituto helmholtz – Alemanha), Profa. Dra. Sheila Cardoso Silva (Universidade Federal do Acre), Prof. Dr. Welber Smith (Universidade Paulista campus Sorocaba) e Prof. Dr. Marcelo Pompêo (USP, Depto de Ecologia).

Destaca-se que a Dra Frascareli estagiou por um ano no Instituto Helmoltz-Magdeburg, com bolsa financiada pela Capes (Processo 88887.165060/2018.00), onde teve a oportunidade de complementar sua formação acadêmica, aprendendo diferentes procedimentos e técnicas para coleta e análises de amostras de água, solo e sedimentos de reservatórios. Nos demais anos do Doutorado foi bolsista Fapesp Processo n° 2016/15397-1.

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.

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