CRÔNICAS DE IBIÚNA – DOMINGO, NA PORTA DA IGREJA MATRIZ

Sento-me num dos bancos existentes à sombra das árvores defronte à entrada da Igreja Matriz de Nossa Senhora das Dores. Minha agenda mental está em aberto, pura como a dos anjos. Despojado de qualquer preconceito, apenas olho, observo o movimento.

Hoje é domingo, dia santo. Os fiéis da primeira missa saíram agora há pouco. Não os vi entrar, pois cheguei depois que a missa deve ter começado. Se os tivesse visto entrar, talvez poderia tentar adivinhar, por suas expressões faciais, se foram atendidos em suas buscas de alívio espiritual. Mas, noto que estão mais leves, sorridentes, amigos e parentes se cumprimentam.

Quando eu era criança, acompanhava meus pais em algumas missas na Igreja Matriz da minha cidade natural. Como acompanhava, mecanicamente, os movimentos orientados pelo oficiante, sentia meus joelhos doerem pressionados contra a dura madeira que se encontrava na parte de trás, embaixo do assento da frente.

Gostava do cheiro e de ver a fumaça do incenso que hoje interpreto como um meio de purificar as mentes, de modo simbólico, como, na verdade, ocorre em todo o ritual da missa. Tudo é representação: as leituras da Bíblia e seus significados metafóricos, a hóstia consagrada, simbolizando o corpo de Cristo, capaz de apagar nossos pecados cometidos durante a semana, ou há muitos anos, se houver ainda um sentimento de culpa.

A imagens laterais dos santos e do altar-mor intrigavam os olhos do menino. As expressões não eram de alegria, mas de dor e sofrimento, com exceção de nossa senhora, que transmitia mais uma imagem consoladora benevolente. Mãe é mãe. Está para nos proteger contra todos os males.

Confesso que não apreciava, em geral, as homilias dos padres, com raras exceções. Eram cansativas, algumas batiam com tamanha insistência na questão do pecado e em lições de moral e, por serem especialmente longas, chegavam a me aborrecer. Queria logo voltar para casa e ir jogar futebol ou qualquer outro brinquedo.

Mas essas ressalvas passam longe de desmerecer as liturgias. Ao contrário: a fé é uma prática humana que merece todo o respeito, seja ela qual for. É uma prerrogativa do outro crer naquilo que, de alguma forma, lhe traz consolo, paz e esperança. Há também aqueles que têm seus próprios e diferentes modos de se relacionar com a existência. E não há nada de errado com isso. Importante é cultivar o amor por si mesmo e pelo próximo. (Carlos Rossini é editor de vitrine online)

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.

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