PERSONA – DEFENDER A NATUREZA É O QUE VIVIANE MAIS GOSTA DE FAZER
Em 2019, Viviane Oliveira, paulistana do bairro Sumarezinho, diretora-executiva da SOS Itupararanga, recebeu o título de “Cidadã Ibiunense” em reconhecimento pela sua notável contribuição à causa da natureza. A honraria, como se verá ao longo dessa notícia, terá sido uma resposta direta à sua vocação. Defender a Natureza, simbolizada na mitologia egípcia, pela deusa Isis, é o que Vivi mais gosta de fazer.
Filha de Henrique Leonel de Oliveira, 77, e de Ilma Rodrigues de Oliveira, 75, tem um irmão caçula, Denis Rodrigues de Oliveira é empresário em Delfinópolis, em Minas Gerais.
Feirante em São Paulo desde solteiro, Henrique atua nesse ramo na atividade até hoje. A mãe, quando solteira, foi supervisora de vendas. Depois de casados em 1971, passaram a trabalhar juntos nos varejões da Ceagesp (Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais do Estado de São Paulo).
Até hoje, trabalhamos juntos nos varejões desde sua criação, em 1979, todos os sábados e domingos, sendo nossa especialidade o comércio de tomate.
PLANTAÇÃO DE TOMATE
Vitrine online – Desde quando você conhece Ibiúna?
Viviane – Meus pais compraram um sítio no bairro Veravinha, em 1980. Desde então, passei a frequentar minha querida Ibiúna com apenas 7 anos de idade. Lá no sítio, meu pai plantou tomate por muitos anos. Hoje não exercemos mais esta atividade.
Quando comecei a trabalhar na SOS Itupararanga, em março de 2003, o sítio passou a ser minha casa, até 2013. Infelizmente, e muito contrariada, me mudei para o bairro Residencial Europa, onde moro hoje. As dificuldades de acesso por causa da estrada ruim e a precariedade do transporte público, principalmente nos períodos de chuva, fizeram com que eu deixasse aquele que era meu paraíso para morar mais próximo do trabalho. Assim, não correria o risco de perder dias de trabalho e compromissos tão importantes.
Vitrine online – Como foi sua educação formal?
Viviane – Completei o ensino médio em São Paulo, em 1991. Tive o privilégio de estudar em escola particular minha vida toda, e essa bagagem foi muito importante para o meu processo de aprendizado.
Quando ingressei na ONG, em 2003, não tinha feito ainda nenhum curso superior. Sequer sabia mexer em um computador!
Considero-me autodidata, pois todo o conhecimento que adquiri, até 2018, foi através de muito esforço, estudo, participações nas inúmeras reuniões, oficinas, audiências promovidas pelo comitê de bacia e pelos conselhos de âmbito municipal e estadual e claro, com a vivência do dia a dia.
Em 2018, ingressei pela primeira vez em uma faculdade, e iniciei o curso superior de Tecnologia em Gestão Ambiental, modalidade de educação à distância (EAD), na Faculdade Uninter – Polo Ibiúna.
Em 2020, cursei a pós-graduação em Manejo de Pragas e Doenças Florestais e Agronômicas, também na modalidade EAD, pela Agropós (MG).
Em 2021, iniciei uma nova graduação EAD, em Tecnologia em Saneamento Ambiental, também pela Uninter, curso que finalizará em setembro do corrente ano.
Este ano, também estou cursando uma nova pós-graduação em Engenharia Ambiental e Sanitária, pela Faculdade Estácio – polo Ibiúna, mais uma vez um curso EAD.
Vitrine online – Você dedica a sua vida à causa ecológico-ambiental. Como isso aconteceu em sua vida?
Viviane – Mesmo trabalhando com meus pais na Ceagesp, sempre fui apaixonada e muito dedicada à causa ambiental, realizando pequenas ações, de maneira informal e voluntária.
Entre os anos 1992 e 1993, fui monitora voluntária no Parque Estadual do Jaraguá (Pico do Jaraguá), ainda naquela época vinculado à Secretaria de Estado de Esportes e Turismo de São Paulo.
Por volta dos anos 1998 a 2000, adotei a Escola Municipal do Bairro Veravinha, e lá realizava, de forma voluntária, atividades com as crianças, atividades estas que eu nem imaginava que se chamavam EDUCAÇÃO AMBIENTAL. Por muitos anos, colaborei com a escola também com a doação de materiais escolares e a construção de um novo banheiro.
Entre 2001 e 2003, retornei ao Pico do Jaraguá, já sob a gestão da Secretaria Estadual de Meio Ambiente. Com um novo plano de trabalho, o parque recebia durante os dias da semana (de 3ªs às 6ªs feiras), visitas agendadas de escolas, e passei a integrar a equipe de monitores para a recepção dos alunos e professores. Durante as visitas, os participantes percorriam as trilhas que dão acesso ao pico, o grande atrativo do parque. O parque fechava às 2ªs feiras, que eram dedicadas ao trabalho de manutenção e limpeza das trilhas na mata.

A DESCOBERTA EM UM LIVRO
Em uma 2ª feira chuvosa, quando estava inviável o trabalho de campo no parque, eu e uma colega monitora resolvemos organizar os livros na pequena biblioteca que existia ali na sede administrativa.
Na prateleira, encontrei o livro “Unidades de Conservação: conhecer para conservar”, uma publicação de autoria da própria Secretaria do Meio Ambiente. Folheando o livro atenciosamente, encontrei uma tabela com as unidades de conservação do Estado de São Paulo, e dentre elas, surge o Parque Estadual Jurupará (Peju), uma área protegida no município de Ibiúna. Ali vi a oportunidade de fazer meus trabalhos voluntários em uma área importante na minha cidade do coração!
Enfim, entre tantos contatos em busca de descobrir como eu poderia ser voluntária no Peju, conheci a diretoria da SOS Itupararanga, que me convidou para trabalhar na entidade.
E assim, há 19 anos estou nesta equipe, representando a ONG, coordenando seus inúmeros projetos e defendendo os interesses da sociedade.
Vitrine online – Para você, o que é a SOS Itupararanga?
Viviane – A princípio, a realização de um sonho, pois me permite trabalhar naquilo que eu mais gosto de fazer: a defesa do meio ambiente.
Mas, a ONG é um importante canal de comunicação, com poder de articulação, de mobilização, de sensibilização, de informação, que envolve todos os segmentos importantes neste processo de gestão: população em geral, produtores rurais, professores, jovens, pescadores, usuários dos recursos ambientais.
Vitrine online – Como você avalia a tomada da consciência ambiental dos municípios relacionados na APA?
Viviane – Acompanho os assuntos sobre a APA desde 2003. Naquele ano, a lei que criou a APA havia sido alterada, passando a incluir os 8 municípios da bacia hidrográfica da represa, que não tinham sido contemplados na lei original de 1998.
A partir dali, houve uma grande mobilização para a construção do Plano de Manejo da APA, que contou com a participação da sociedade civil da região. O plano é o instrumento que atenderia (e atende) o grande anseio para o planejamento do crescimento da região, incluindo todo o conhecimento, mesmo que empírico, as fragilidades e as preocupações das populações locais sobre o território da APA.

O processo de elaboração do plano de manejo e do zoneamento da APA, bem como, a própria atuação do Conselho Gestor da APA e do Comitê de Bacia ao longo destes anos, contempla desde então diversas oficinas participativas e a capacitação dos seus integrantes, melhorando a qualidade da participação, aprofundando o conhecimento técnico e ampliando a divulgação das informações sobre a gestão da APA. Estes fóruns, que também reúnem as instituições estaduais e municipais, permitem a participação direta da sociedade civil organizada nos processos de tomada de decisão.
Vitrine online – Que pontos você destaca do ponto de vista de evolução e de melhorias observadas na região?
Viviane – A ampliação das infraestruturas de saneamento nos municípios da APA é um bom indicador desta evolução na gestão. A preocupação com a qualidade da água do reservatório e de seus afluentes em razão do despejo de esgotos sem tratamento é pauta permanente nos fóruns de discussão, e os projetos de saneamento na APA são considerados prioridade para recebimento de recursos financeiros.
Hoje, vemos Ibiúna recebendo projetos de abastecimento de água e tratamento de esgotos em diversas comunidades rurais; São Roque implantou um sistema de tratamento de esgotos no bairro do Carmo; Vargem Grande Paulista já possui uma ETE (Estação de Tratamento de Esgotos); e para o Distrito de Caucaia do Alto já estão em fase de licenciamento estações elevatórias de esgotos.
CRISE HÍDRICA

Recentemente, as discussões sobre a crise hídrica do reservatório de Itupararanga também comprovam a importância e a eficácia da atuação dos órgãos gestores colegiados neste processo. O tema, que até então não dispunha de tantos dados e informações abertos, de responsabilidade das empresas usuárias do reservatório (abastecimento público e geração de energia), passou a ser tratado de forma ampla, com informações abertas, melhorando a qualidade das discussões e subsidiando as decisões tomadas para minimizar os efeitos da crise hídrica.
A participação social por meio da apresentação de denúncias de crimes ambientais é outro indicador importante. O aumento da conscientização, aliado às redes sociais e aos aplicativos de mensagens contribuem muito, principalmente, para que os crimes e infrações sejam identificados e penalizados conforme a legislação.
Os processos de licenciamento ambiental de atividades e empreendimentos na APA também podem ser considerados um indicador positivo, pois a sociedade passou a indicar suas preocupações e a participar de forma mais direta destas decisões.
Vitrine online – O que você acha de Ibiúna e o que, na sua opinião, precisa melhorar no município?
Viviane – Ibiúna é um município estratégico quando falamos em meio ambiente, em especial, em recursos hídricos. Abriga dois importantes mananciais de abastecimento público: o reservatório de Itupararanga, que abastece as cidades de Alumínio, Mairinque, Votorantim e Sorocaba; e o reservatório do França, que leva suas águas para quase 2 milhões de habitantes da região metropolitana de São Paulo.
O município está inserido em duas Unidades de Conservação do Estado de São Paulo: a APA de Itupararanga e o Parque Estadual Jurupará, o que comprova sua relevância do ponto de vista da conservação ambiental.
Ibiúna também tem sua agricultura como uma atividade representativa, que leva hortaliças para a mesa de milhões de pessoas para importantes cidades do país.
Somente estes quesitos já tornam Ibiúna um município que merece (e necessita) de investimentos e apoio técnico para garantir a produtividade de suas lavouras, a qualidade e a quantidade das águas e de toda a biodiversidade que possui.
‘DESCASO COM MEIO AMBINTE’
O que falta é comprometimento do poder público local. Infelizmente, ao longo dos anos, o que se tem observado é o “descaso” com o tema ambiental. A velocidade acelerada da degradação é acompanhada pela falta de fiscalização e de rigor nas autorizações emitidas; no descumprimento de leis básicas, como o lançamento de esgotos nas galerias de águas de chuva da cidade em locais onde já existe a rede coletora; na permissão de ocupação de áreas de preservação permanentes ao longo dos rios e nascentes; ausência de projetos de recuperação das áreas degradadas; descuido e despreparo para a gestão da destinação do lixo, como aconteceu com nosso aterro sanitário, que foi referência na região quando da sua inauguração; falta de programas de extensão rural e de apoio ao produtor para a regularização ambiental de sua propriedade, já que este é um segmento vital para garantir a produção de água na bacia de Itupararanga.
Vitrine online – Resumidamente, que conquistas importantes você apontaria no desempenho da SOS Itupararanga?
Viviane – A SOS Itupararanga desenvolve projetos em diversas áreas, como educação ambiental, tratamento de esgotos em comunidades rurais de Ibiúna, formação de jovens e fiscalização. A participação efetiva da ONG nos órgãos colegiados também reflete estes avanços.
Hoje, a ONG está desenvolvendo o projeto Nossa APA II, levando mais de 17.000 kits de materiais educativos para alunos e professores das escolas das redes municipal e estadual das cidades que integram a APA (Alumínio, Cotia, Ibiúna, Mairinque, Piedade, São Roque, Vargem Grande Paulista e Votorantim).
A SOS Itupararanga também está executando mais um projeto de implantação de biossistemas, que já atendeu os bairros Carmo Messias, Verava, Tibúrcio, e está chegando ao Lageado e Morro Grande, com mais de 160 famílias beneficiadas.
O curso de informática já promoveu a inclusão digital de mais de 1.200 jovens ibiunenses.
E a Patrulha Náutica, uma iniciativa da ONG, continua em ação desde 2005, sendo operada pela Guarda Municipal de Ibiúna, que recebeu em 2017 uma nova embarcação doada pela SOS Itupararanga.
PROVIDÊNCIAS DECISIVAS
Vitrine online – O que falta para que a represa Itupararanga seja salva, em virtude da poluição, da queda do nível do volume das águas, e a presença de nutrientes e agrotóxicos?
Viviane – Mais rigor no cumprimento das leis. Mais rigor na fiscalização. Mais rigor nos processos de licenciamento ambiental, seja no âmbito municipal, seja no âmbito estadual. O que temos visto em Ibiúna são intervenções e empreendimentos autorizados em áreas sensíveis, como o aterro das várzeas dos rios, a supressão de vegetação autorizada em áreas que deveriam ser conservadas; o surgimento de loteamentos sem que sejam atendidas as diretrizes da APA.
É muito importante ainda que o poder público estadual e municipal ofereça apoio técnico ao produtor rural, para melhorar o manejo da produção, para melhorar o manejo da água e do solo na propriedade, o controle de doenças e pragas e garantir boa produtividade nessas terras que precisam continuar cultivando alimento, para que não tenham como destino tornarem-se futuramente mais um loteamento clandestino…
Vitrine online – Ultimamente, você tem postado vídeos e fotos de riachos, nascentes e rios com uma alegria e positividade notáveis.
Viviane – Amo muito meu trabalho. Esta é a minha vocação. Amo Ibiúna e todas as suas riquezas, nossa gente, nossa terra. Como encerrei meu discurso na cerimônia de entrega do meu título de cidadã ibiunense: “Ibiúna, verás que um filho teu não foge à luta, nem teme a quem te adora a própria morte ! ”
NOTA DA REDAÇAO: A coluna PERSONA é um projeto editorial da revista vitrine online que deverá se transformar em livro denominado PERSONAGENS IBIUNENSES.