SILVEIRINHA ERA FISSURADO EM DIRIGIR CARRINHOS DE SUPERMERCADOS

Silveirinha adora fazer compras em supermercados, em hipermercados, bem maiores e com corredores mais largos, então se sente no melhor dos seus mundos esportivos. Gosta tanto do esporte que pratica que até se oferece para servir os vizinhos, oferecendo-se para realizar as compras ele gratuitamente.

Ele já tem idade adulta, mas quem sabe o que há dentro da mente humana. Lembro ter lido uma história de um homem, aproveitando que a mulher ia chegar tarde, mas como ela cortou sua agente e chegou no meio da tarde e flagrou seu marido brincando com um trenzinho do meio da sala. “Fiu,fiu…”

Mas Silveirinha não conseguia se conter quando estava dentro de um supermercado. Pegava um carrinho de compra grande agarrava a braçadeira com as duas mãos e saia pelos corredores internos fazendo manobras incríveis, curvas fechadas com apenas duas rodas tocando o piso, quando se via com a “estrada livre” pisava fundo na maior velocidade. Reduzia a marcha só quando se aproximava da prateleira de sapatos e havaianas.

Às vezes ao passar perpendicularmente um corredor via alguém indo na mesma direção acelerava numa competição que somente ele tinha em mente.

As mercadorias mais pesadas ele colocava na parte do fundo do carrinho o que permitia que ele empinasse o carrinho, numa manobra espetacular, para ele.

Por saber onde se encontram as mercadorias como repositor, podia fazer uma compra em poucos minutos, mas isso era esperar demais do Silverinha. Nesse caso, dava uma volta completa de maior amplitude pelos corredores como se estivesse testando a pista. Observava atentamente o piso para evitar algum líquido escorregadio de um vidro que se quebrou e derramou o produto no chão. O prazer dele era se aproximar o mais perto possível do líquido para dar um cavalo de pau para escapar daquela armadilha.

Silveirinha sonhava constantemente como essa imagem: estrada livre, um convinte para aventura

O tempo todo, mas de modo discreto ele fazia um barulho de motor na garganta como se fosse ventríloquo. Raaaaaammmmmmm! Cada ronco correspondia a uma marcha.

Um dia em que ele estava ansioso e eufórico para dirigir num supermercado, por algum motivo que não sabemos ainda, ele atingiu em cheio uma prateleira promocional de ponta, alguns minutos depois dela ter sido construída pacientemente pelo promotor. Foi um grande barulho com garrafas de cerveja se quebrando no chão.

Está certo que ele alegou que tinha escorregado no piso molhado para não pagar um mico. Com medo de dirigir, voltou a trafegar com os carrinhos menores pensando que, assim, em alguns meses estaria livre de ser um maníaco.

Nesse período ele se comportou educadamente. Já não cantava os pneus ao se aproximar das caixas. Não queria mais chamar atenção pela força de seu hábito extravagante. Afinal, ele logo iria completar quarenta anos.

A partir daí, devido ao seu novo comportamento, toda vez que chegava na boca de um caixa era saudado: “Olá, seu Silveirinha, o senhor já tirou seu cartão do nosso clube de descontos?”

Nesse exato momento ele pensou: “Será que seu entrar no clube terei uma carteira preferencial para dirigir o carrinho?”

“Quem sabe se o clube organiza um campeonato interno para os dias em que o supermercado estiver fechado?!

E já pensou em encomendar um carrinho personalizado com rodas mais largas, suspensão hidráulica, faróis, lanternas… (C.R.)

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.

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