DEPRESSÃO DO PADRE MARCELO ROSSI REFLETE OS SENTIMENTOS DO POVO

“Perdi todas as liberdades necessárias…Você fica sabendo de cada caso com que a pessoa vem confessar com você e você não vai chegar no seu quarto, fechar a porta e desconectar. É difícil.” Estas talvez sejam as mais comoventes e profundas respostas da entrevista dada pelo padre Marcelo Rossi na noite deste domingo a Renata Vasconcellos, no programa Fantástico (Rede Globo).

Aos 46 anos, voz cansada, bastante magro, pálido e rosto triste, maior fenômeno da mídia no Brasil na difusão da fé católica, o sacerdote admitiu ter sofrido depressão (que ainda permanece mais branda) e anorexia. Disse ter feito um desses regimes malucos durante seis meses, desses “que não recomendo para ninguém”, mas que agora se sentia bem [há quinze dias voltou a alimentar-se como antes]. Rossi calculou ter perdido cerca de trinta ou quarenta quilos, comendo diariamente alface, cebola e três hambúrgueres por dia [dois pela manhã e um à noite].

Há três anos, o padre caiu durante exercício de esteira ergométrica que o deixou numa cadeira de rodas por seis meses, foi a partir daí que passou a se sentir deprimido. Ele disse que nunca fez terapia e o que o salvou foi escrever, cantar e orar, pois agora se diz estar em estado perfeito de saúde.

Padre Marcelo Rossi informou que não é ligado em coisas materiais, que doou tudo para a Diocese, incluindo um templo para sessenta mil pessoas. Ele celebrou dezenove anos de sacerdócio no domingo retrasado (1º).

Sintoma do povo

Rossi se disse humano e, portanto, sujeito à depressão que antes ele considerava uma “frescura”. Habituado a se relacionar diretamente com grandes multidões e por meio da televisão, talvez tenha sofrido o que a entrevistadora chamou de “excesso de exposição”, mas que consideramos, na realidade, a possível ocorrência de um fenômeno de absorção de um sintoma que atinge milhões de brasileiros. Nunca os médicos prescreveram tanto antidepressivos para o povo brasileiro que, por se sentir generalizadamente inseguro, perde, como o sacerdote, “todas as liberdades”. Sem liberdade o homem não existe senão como uma forma de angústia, com uma sensação de mal-estar crônica.

No século passado o mais famoso filósofo existencialista, Jean Paul Sartre, apontou que o homem está destinado a ser livre, a ter que tomar suas próprias decisões, a escolher como quer viver. Sem isso resta a angústia da liberdade que significa uma espécie de “má-fé de fugir da liberdade”.

É o homem que tem que dar sentido à própria vida, pois ela em si é desprovida de significado. Por isso mesmo, diz de outra forma o filósofo, “a vida nos parece absurda” (como é) e, também, por isso, como disse corretamente o padre Marcelo Rossi todos estamos sujeitos à depressão, até mesmo um sacerdote que se tornou um símbolo da fé católica.

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.