A ESPERANÇA ERA UMA DEUSA, ATÉ A ‘INVENÇÃO’ DA POLÍTICA

Na mitologia grega, Elpis, a deusa da esperança, é representada por uma jovem graciosa, muitas vezes carregando flores ou uma cornucópia, símbolos da abundância e do futuro promissor.

Conta-se que o povo grego tinha um relacionamento complexo com a ideia da esperança. Às vezes a considerava como algo positivo, mas também como incerteza, quando a esperança se mostrava vã, ou seja, não se concretizava.

O filósofo espanhol Baltasar Gracián, que viveu no século 17, em suas famosas lições, escreveu: “A esperança é uma grande falsificadora”, argumento compreensível, no sentido de que ela nos faz aguardar algo que pode não acontecer ou improvável.

Além do bordão “quem espera sempre alcança”, quando a esperança se apresenta na sua magnífica versão positiva de crer, ter fé, em que coisas boas aconteçam em nossas vidas, o uso político da esperança se tornou um dos mais frequentes modos de manipular a cabeça das pessoas.

Governador e prefeitos se apresentam como showmen, desempenhando papeis de puro entretenimento, aparentemente embriagados pelos efeitos que o poder provoca no comportamento humano.

É notável que também integram uma espécie de confraria política recheada de abraços, troca de informações e alinhamentos típicos de grupos de interesse, em que não faltam olhares atentos a sinais de prestígio.

Veja se isto acontece em sua  cidade. A esperança sempre está vinculada a algo que não ocorre aqui e agora, mas no futuro, um tecido feito de promessas formuladas pelos políticos.

É oportuno frisar que não há nada de errado com a esperança como necessidade e desejo humano.

Mas é bom deixar claro que os políticos profissionais a utilizam em suas campanhas eleitorais como uma forma de manipulação, ao  explorar as emoções dos eleitores, sobretudo dos mais simples e crédulos, e que são deixados ao largo das ações concretas, que são as bases do progresso e da construção de um futuro melhor. Quem pode ser contra um futuro melhor, ainda que se trate de uma utopia?

Repetimos: esperança diz respeito a um tempo que não existe, o futuro, enquanto a única realidade possível é o presente em que se apresentam as necessidades efetivas da população. Exemplo palmar: uma pessoa enferma exige ações e cuidados imediatos, já que no futuro, aliás nem muito distante no tempo, a situação pode se agravar seriamente.

Boas intenções declaradas não são exatamente o modo objetivo adequado de se resolverem problemas que exigem atitudes no andamento da carruagem, ainda que esta esteja necessitando de reparos a defeitos pré-existentes para se manter funcionando.

Todo governo não despótico ou não autocrático tem prazo de validade no cenário da democracia. O tempo se encarregará inexoravelmente de sua transição.

Há tempo para a campanha, tempo para celebrar a eleição, a lua de mel com o poder, como recebimento da chave que abre as portas dos palácios executivos, a prática de gerenciamento, a entrega das responsabilidades públicas, a conquista do respeito e aprovação popular, tempo de novas eleições, e assim por diante.

Em suma, um futuro somente poderá ser promissor, de fato, se o presente se constituir de ações coerentes e compatíveis com aquele propósito. (Carlos Rossini é jornalista, diretor da TVUNA e editor de vitrine online)

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.

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