CRÔNICA – UM BREVE OLHAR SOBRE O GRANDE DESEJO HUMANO

Por esse caminho vou e volto todos os dias. É diferente é muito menor do que a avenida Paulista, mas é o meu caminho de ir e vir que sigo levando e trazendo pensamentos e sentimentos que surgem em minha mente sem que os peça ou mesmo os queira ter, pois na maior parte das vezes podem não ser bons e tampouco felizes. Mas são, igualmente, meus, fazem parte do meu trânsito diário.

 

Eles são entes diurnos, pois à noite não têm a toada superficial da vigília, quando são desordenados, simbólicos, autônomos e que parecem viver em outras estradas e caminhos do que foge ao alcance da matéria física, que se pode ver, tocar, senti, ainda que aqui, nesse terreno, os mistérios persistam, com outras roupagens e cenários que brotam do invisível.

 

um novo olhar

É irresistível e, por isso digo, há tanto mistério aqui na mente quanto na infinitude do cosmos. Ambos vêm sendo esmiuçados pela inteligência humana há milênios em busca de uma resposta que nem se revela, ela por si mesma, quando é superficialmente percebida pelo nosso olhar comum e nem mesmo pela razão mais afiada dirigida pela acurada experiência científica.

Sim, ainda adormecidos e sonolentos, andamos ou voamos pelos mais diferentes caminhos que são lugares onde buscamos nos encontrar sem êxito. Às vezes, aqui e ali, por minúsculas frações de nanotempos, podemos quanto muito imaginar a trilha do segredo,  que definitivamente não vemos, mas podemos crê-lo existir.

Mas o caminho me toca com sua imagem, seu chão duro e pedregoso, ou molhado e escorregadio, se chove, mas é que ele é adornado pelo frescor das plantas simples que existem mesmo que não estejamos ali a olhá-las, quando o ambiente está vazio de gentes.

Já o tenho visto tantas vezes que temo estar perdendo a capacidade de ter sempre um novo olhar para ele, porque já se sabe que aquilo que vemos continuamente, rotineiramente, acaba perdendo a frescura da novidade que faz parte da surpresa de cada momento que se muda sutilmente. É como se perdêssemos aquele encanto do viajante que chega a algum lugar pela primeira vez e se sente atrair por todas as formas cores e fenômenos presentes que jamais vira antes.

Mas considero-me a salvo desse perigo, pois, tenho o olhar curioso de um menino que viveu brincando sozinho em riachos de águas translúcidas, a ver peixinhos nadando contra a correnteza e a areia colorida de desmanchando ao toque das mãos, além do que as formigas muito me ensinaram a observar as coisas pequeninas, assim como as partículas atômicas, que constituem todas as formas sempre em transformação, ainda que pareçam estar “paradas”.

Vejo que os homens da eletricidade cortaram muitas plantas e as jogaram ao chão com suas flores vermelhas que tingem a terra e que irão ficar pálidas e desaparecer e ressurgir pelos mais secretos desígnios ocultos dos nos nossos olhares e outros sentidos limitados pela própria natureza que não quer ou mesmo não pode desnudar-se, pois seria a realização suprema do mais profundo desejo humano. (C.R.)

 

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.