SOB O CÉU DE IBIÚNA

arvore céuFoi agora há pouco. Acomodado no meu centro do mundo de onde vislumbro as árvores sob o céu azul e invernal de Ibiúna, agora que estou, disciplinadamente, aprendendo a pensar, que senti um espanto. Batia um vento geladinho de inverno, e as folhas e os ramos dançando pra lá e pra cá. Ouvi, em meio ao sibilar dos pinheiros, a voz de Platão a me dizer: “Existe a matéria – as plantas, os animais, você –, isso é necessário, mas existe Deus que torna você suficiente, isto é, um ser vivo, que se mexe, pensa, ri, chora.”

Mas não havia ninguém ali, só as árvores dançantes, o vento frio e o céu azulíssimo sem nenhuma mácula (?). Então tomado de uma confiança livre fui direto: “Então, me dizem, quem são vocês, de qual segredo vocês promanam? Nada responderam. Pensei que tanto elas quanto eu jamais saberemos o que somos, de onde viemos e para onde vamos. A única certeza é a morte e a vida só é possível dela para trás, porque daí para frente a história cessa e é engolida pelo torvelinho (de luz?) que remete tudo para o mais absoluto silêncio.

“Tudo tem um fim”, sopra Aristóteles – que teria passado como um espectro dançarino entre a caliandria e a primavera e se volatilizado como uma nuvem se dissolve ante nosso olhar. “Nosso fim (finalidade) é a busca do bem aspirado por todos que resulta na perfeição, na excelência, na arte ou na virtude.”

“Mas você vai mesmo publicar isso?” – indaga um beija-flor que veio bebericar no potinho pendurado na varanda. “Por que, não?” – contrapus. O pequeno animalzinho num flash desapareceu.

Há duas correntes opostas bem-definidas. Uma tenta explicar tudo pela presença de um demiurgo e criador oculto [Deus]. Esse é o papel da teologia ao longo do tempo. A outra se firma na modernidade. Com o uso da razão e da experiência, o homem assume para si a missão de encontrar as explicações da existência por meio do desenvolvimento da ciência. Esse debate prossegue até os dias presentes, depois da superação de vários conflitos entre a Igreja e as descobertas científicas, como o heliocentrismo, o darwanismo e um vasto delta alimentado pela sedimentação do ateísmo.

O fato é que todo o conhecimento acumulado até hoje pela filosofia, da qual surgiram as psicologias, e pela ciência experimentalista, não foi suficiente (e talvez nunca o será) para nos tirar das dúvidas existenciais que nos assolam a cada instante.

Há, de acordo com pensadores da pedagogia, quatro situações específicas em que o conhecimento é gerado e compartilhado: a acadêmica, a erudita, a popular e a de massa. Sem excluir nenhuma delas, pois são realidades incontestáveis [embora mutáveis no tempo], para a maioria da humanidade essas questões muito complexas talvez nem sejam percebidas, muito menos reconhecidas.

A cada momento há nova descoberta. Ainda há poucos dias se anunciou que há vasos linfáticos também no cérebro. Quando o cientista pesquisador percebeu esse fato, até então desconhecido, admitiu ter sentido pânico. Esse descobrimento já se tornou objeto de estudos de cientistas em todo o mundo. Assim também ocorreu, mas numa velocidade infinitamente mais reduzida, com o anúncio de que a Terra girava em torno do Sol, e não o contrário, como pregava inflexivelmente a Igreja que, por isso mesmo, condenou muitos à fogueira.

Tudo isso aconteceu em minha mente, depois que aprendi o significado da palavra teleologia. Você acredita nisso, leitor? (C.R.)

 

 

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.