CRÔNICA – É CADA VEZ MAIS DIFÍCIL SER JOVEM NUM MUNDO BOBO E EGOÍSTA
Na semana passada, um jovem estudante da Universidade Mackenzie, em São Paulo, na região do bairro Consolação, participava de uma festa à noite com outros jovens e estudantes como ele.
Se não me falha a memória, a notícia informava que ele tinha vinte e três anos. Deixou a festa e foi para o apartamento onde morava nas proximidades.Segundo o porteiro do prédio, ele entrou tirando a roupa, agitado e tomou o elevador e subiu.
Instantes depois era encontrado piso no edifício, depois de voar do décimo terceiro andar direto para a morte. Vi essa notícia no site da UOL. Havia dois comentários sob a notícia. Não me recordo do primeiro, mas o segundo calou fundo e foi escrito por outro rapaz. Logo após umas três ou quatro palavras ele concluiu:
– “É difícil ser jovem.”
É verdade. Ser adolescente/jovem talvez seja ainda mais do que isso: é perigoso. É o momento da vida em que esta parece ser infinita, os hormônios da vitalidade à flor da pele, aventura, prazer, amar, experimentar.
A juventude é já se ter lançado no mundo para se desprender dos pais para afirmar a própria independência (individuação, se diz em psicologia), descobrir e viver o próprio destino. É morrer para o passado da dependência de tudo para a liberdade de ser si mesmo, que se realiza, na realidade, no encontro com os outros que também estão no mesmo mundo a procura do mesmo tesouro, que atende pelo nome EU, TU, NÓS, nas reuniões das tribos de todos os bares e casas noturnas.
Como viver é perigoso, mesmo que a pessoa não saia de casa pensando estar protegido, então o jovem circula por uma floresta em que não vivem os avatares, mas armadilhas da insensatez humana.
Em Santa Maria, foram-se duzentos e trinta e oito de uma vez só, intoxicados por uma fumaça maldita de uma esponja-veneno. Essas moças e rapazes, bonitos, sorridentes, em busca dessa convivência intercambiada pela música, pela dança e pelos encontros que abrem os portais dos sonhos. Morreram numa câmara de gás com a fachada insinuando um beijo, um beijo fatal.
As drogas. No processo de buscar a liberdade do lar de origem, o jovem fica mais frágil, pela própria inexperiência e personalidade ainda meio tíbia, e sujeito aos hábitos correntes: maconha, cocaína, crack, bebidas alcoólicas, tudo misturado. E o mundo fica engraçado, sem pé nem cabeça, perde sua autoridade e os símbolos do poder. Sou mais, e daí? Daí a dependência transferida para substâncias, muitas vezes gravíssimas, com um fim dramático individual e familiar.
O carrão, a moto de muitas cilindradas, a velocidade, a sensação de vencer o tempo e o espaço, de ultrapassar limites, a sensação de poder de ser um deus, o êxtase de superar a morte simbolicamente, mesmo na hora do sexo isso existe. Mas, de repente, o carrão capota, a moto voa para fora da entrada. O sexo perde o sentido e se transforma mais em um fato social do que um fato natural.
Depois o vazio e a ansiedade incontrolável de ter que preenchê-lo novamente como agem os dependentes, que roubam os próprios pais, a casa, o que for possível para garantir a próxima ilusão e a repetição do ciclo.
Quando não é isso tudo, o jovem deixa a festa de aniversário num barzinho, volta para casa, no caminho é surpreendido por policiais ou bandidos que atiram antes mesmo de saber quem está dentro do carro e mais uma família perde a graça de viver.
Haveria muito mais a dizer em favor do comentário “é difícil ser jovem”. Só acrescentaria que ser jovem é difícil também porque o futuro se esfumaça diante dele. Tem que acreditar que estudar é crucial para garantir o futuro e não encontra emprego porque a economia tem o objetivo próprio e as empresas são organismos egoístas que só pensam em si mesmas, em sua existência e em seu crescimento. Isso é lógica. As pessoas, como caixeiro viajante, são as que passam, como aconteceu nossos pais e avós, que se esfalfaram e só viram de fato acontecer duas coisas: a chegada da velhice, para que chegou lá, e as dificuldades de comprar remédios que o salário da aposentadoria já não consegue pagar.
É, meus caros, é verdade: ser jovem é difícil e também ser velho num mundo que hipervaloriza a tecnologia, a circulação do dinheiro controlada por magnatas das bolsas de valores, e gera uma ilusão incapaz de enganar os jovens, que é disso que trata esta crônica. (C.R.)