GREVE DE CAMINHONEIROS PODE SER UM ACONTECIMENTO DISRUPTIVO
O impacto da greve dos caminhoneiros sobre a nação brasileira, ainda que se desfaça nos próximos momentos (ou dias), foi como se tivesse ocorrido um abalo sócio sísmico em todo o território nacional, pode se configurar como um acontecimento disruptivo [quando algo inesperado surge para modificar uma situação em maior amplitude].
Não apenas o susto, não apenas o medo generalizado, não o sentimento de insegurança, não os fatos reais decorrentes do desabastecimento de produtos, não as reduções e paralisações na prestação de serviços de toda a ordem, não a justificada desconfiança generalizada nas palavras de autoridades pífias, não das vantagens de oportunistas que aproveitam para tirar uma casquinha aumentando os preços e oprimindo ainda mais a população, mas a percepção de que é preciso dar um basta a governos corruptos e irresponsáveis.
A sacudida e os tremores que ainda se sentem por todo o país podem significar o início de um processo em que não apenas o preço do diesel deve ser reduzido, mas muitos outros, como gasolina, gás de cozinha, a desoneração fiscal [os brasileiros pagam os maiores impostos do planeta] e, por isso, tudo é tão caro e inacessível para largas parcelas da população.
O povo que exibiu um formidável panelaço no domingo enquanto Michel Temer fazia seu pronunciamento na TV cedendo às reivindicações dos caminhoneiros, já não suporta tanta pressão e ataques aos seus bolsos pelo governo, e deverá, mais uma vez, ser escalado para pagar pelas concessões anunciadas para reduzir custos do diesel e dos pedágios aos caminhoneiros.
De seu lado, o governo se sentiu tão surpreendido [subestimado os problemas reais da população e apostando suas fichas na passividade dos brasileiros], quanto emparedado e assustado quando se deu conta do tamanho e da gravidade do movimento que tem obtido o apoio e a simpatia da sociedade, em forma de ações efetivas, como fornecer alimentos, lavar roupas e aplaudir seus heróis.
Em 2016, aqui mesmo nestas páginas, destacamos uma frase atribuída ao escritor russo Fyodor Dostoievski (1821-1881), sem garantia de que seja dele mesmo: “A autoridade só existe, se faz sofrer”. O contexto era outro, mas também envolvia o setor de transportes, no caso de escolares municipais.
Acredite-me, leitor(a), a experiência me permite notar que [tirando as exceções que, naturalmente, existem] os políticos costumam fazer sofrer e enganar o povo, movidos por diabólicos ambientes criados pelo poder e suas turbulências e da ambição de fazerem de tudo para se manterem em seus postos de comando, custe o que custar.
É oportuno mencionar, também sem assegurar que se trate de fato real, a rainha da França, Maria Antonieta, quando lhe disseram que o povo na miséria estava passando fome por falta de pão, ela teria dito: “Se não têm pão, que comam brioches”. Brioche é um tipo de pão francês.
Em nossa pátria atual, as carências são bem maiores e abrangentes: saúde, segurança, emprego [faltam 14 milhões], educação, alimentação, casa própria, saneamento básico, etc., enquanto privilegiados enquistados no poder e em seu entorno tiram todas as vantagens em prejuízo das precárias condições de vida de largas faixas da população. As autoridades são impiedosas, arrogantes, ambiciosas, além de incompetentes e frequentemente corruptas e corruptoras.
Já escrevemos nestas mesmas páginas que, sem ser preciso espremer nosso cérebro, é simples perceber o fim de todas as histórias, incluindo novelas que entretêm milhões de brasileiros nas noites dos trópicos. E, por isso mesmo, evocamos um breve poema do poeta chileno, Pablo Neruda, para que esses malfeitores sejam advertidos e, em suas horas, não estranhem ao verem as portas do Céu trancadas, mas lhes será franqueada a porta do Inferno:
“Algum dia em qualquer
parte, em qualquer lugar
indefectivelmente te
encontrás a ti mesmo,
e essa, só essa,
pode ser a mais feliz
ou a mais amarga das tuas horas. (Carlos Rossini é editor de vitrine online)