PAIXÃO PELO FUTEBOL – SUAS RAÍZES ESTÃO NAS PROFUNDEZAS DO INCONSCIENTE

Declaro, para início de conversa, ser torcedor do Corinthians desde menino e, portanto, faço parte da “Fiel”. Mas se minha paixão era intensa em minha infância e adolescência, tornou-se apenas simpatia.

Isso terá acontecido, talvez, por causa da influência comercial do futebol que lhe tirou parte da graça natural dos movimentos bailados e tornou os atletas mercadorias e celebridades hiperinflacionadas. Outro motivo: a explosão de conflitos mortais entre torcidas que ocorreu em anos passados.  

Onde entra muito dinheiro em jogo, sempre há o risco de desvios e corrupção, sobretudo por parte dos “cartolas” e suas camarilhas nas entidades esportivas oficiais que comandam os espetáculos futebolísticos.

Os jogos de modo geral fazem parte da cultura humana como diversão, sujeitos a regras comentadas nas emocionantes narrações esportivas.

Em momentos acompanhados com magnetismo, atinge-se o prazer quando a bola balança a rede como fim bem-sucedido de uma sequência de jogadas e dribles astutos contra os adversários. O ponto supremo, no entanto, é quando a partida termina e define um vencedor.

Para alguns, como se viu com frequência na crônica esportiva mundial, é uma guerra contra tribos inimigas uniformizadas pelas cores de suas bandeiras e camisas. Dentro e fora dos gramados já houve muitas mortes no embate entre torcedores fanáticos ou com perturbações mentais consideráveis.

No fundo de cada um de nós, uma partida de futebol, ou de outros jogos coletivos, há um profundo registro psíquico dos primórdios da civilização em que os riscos e ameaças eram reais e constantes e nos punham em intensa prontidão quanto à necessidade de atacar ou fugir.

Na realidade e em sentido mais amplo os seres humanos estão de alguma forma sempre jogando uns com os outros e nos tempos atuais passaram a usar habilidades incríveis, como tirar da bolsa de uma mulher o telefone celular de alto valor na movimentada avenida Paulista, em São Paulo, sem que sua proprietária perceba o menor vestígio do ataque. Isso acontece também nas ruas de Roma, de Nova York, Paris, Londres, para citar algumas capitais de países civilizados. O futebol é uma instituição de catarse psicossocial relevante nos planos de segurança.

Os animais humanos têm uma capacidade infinita de criar instrumentos e meios para tirar do outro para garantir sua sobrevivência em qualquer ambiente. A lei da selva não é muito diferente, como sabem todos aqueles que acompanham filmes da vida na natureza. Em suma, os humanos podem ser mais ardilosos e perigosos do que os bichos.

O último jogo que assisti da arquibancada foi entre Corinthians Paulista x Corinthians de Londres. Estava com meu filho do lado e chorei quando o Doutor Sócrates fez um gol de cobertura quase do meio do campo dos londrinos. O estádio estremeceu!

Exatamente por ter raízes profundas no inconsciente humano, como desejo humano de superar arriscar e correr riscos para autopreservação e vencer aquilo que pode ser temido dentro de si e, por isso mesmo, agita mecanismos de “destrutividade” do outro que representa a ameaça, o jogo de futebol se inscreve entre as atividades incentivadas e mantidas pelos países do mundo afora.

Supostamente enquanto se preparam para assistir à uma partida de futebol via midiática ou nos estádios, durante o jogo e pós-finalização as mentes humanas estão ocupadas com esse tema, deixando outros de lado.

As rivalidades entre as torcidas se assemelham às atividades indígenas quando se preparam para se defender ou atacar uma tribo inimiga.

Seus ingredientes desafiadores incluem canto, uso de bandeiras e uniformes, provocações, e carreata embandeirada rumo aos estádios, sem esquecer daqueles, felizmente minoria, que se armam para alguma eventualidade ou oportunidade de manifestar seus transtornos mentais.

Não raro, pessoas de “fino trato” em seus cotidianos profissionais e sociais se tornam irracionais em seus comportamentos relacionados aos jogos.

Apesar de tudo isso, os jogos de futebol têm sua própria beleza, quando há jogo limpo e os desafios comuns dos atletas são revelar suas habilidades e provocar a alegria nos altos e baixos de uma partida que, não raro, começa e termina bem tanto para o vencedor quanto para o derrotado, que pode vencer o próximo jogo e, então, se tornar vencedor. Jogo, como narrativa concreta, é ensinamento para os fatos da vida real. (Carlos Rossini é editor de vitrine online)

 

 

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.

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