DRAMAS POR FALTA DE DINHEIRO TORNAM BANCOS DISCRETAS “CLÍNICAS PSIQUIÁTRICAS”

Os bancos – existem cinco em Ibiúna, três privados e dois estatais – historicamente simbolizam e, de fato o são, o sustentáculo estrutural da economia e das relações sociais baseadas no fluxo e acúmulo de dinheiro. Como as relações econômicas fazem parte de um jogo anárquico, refletindo interesses individuais e grupais organizados com o fim de possuir o máximo possível, a repartição extremamente desigual desse recurso torna a vida um drama diário.

A falta de dinheiro e seu corolário – as dívidas – geram diversos distúrbios e doenças mentais chegando, não raro, a provocar suicídios. Em 1929, nos Estados Unidos, com a quebra da Bolsa de Valores, muitas pessoas que perderam tudo que tinham de um dia para o outro deram cabo à própria vida.

Não ter dinheiro de modo crônico ou agudo torna a pessoa neurótica, insegura e impotente, até mesmo do ponto de vista da sexualidade, porque o indivíduo se sente enfraquecido e um abatimento depressivo que afeta todo seu funcionamento orgânico.

O número de mortes que ocorrem devido a assaltos – os bandidos querem dinheiro e/bens transformáveis em moeda corrente – chega a ser assombroso quando vemos as estatísticas policiais divulgadas, sendo que nem tudo que acontece chega a ser registrado oficialmente.

O dinheiro se tornou um impiedoso demiurgo e é o epicentro da maior parte dos tremores e temores das pessoas e de milhões de famílias que vivem na pobreza.

Os bancos, então, funcionam também como “clínicas psiquiátricas ou psicológicas” de modo mais frequente do que se imagina. Nas filas de esperas, sentados nas cadeiras aguardando o sinal de senha no painel luminoso, ouvem-se histórias realmente tristes. Com um pouco mais atenção auditiva é possível perceber  pelo que o cliente diz, às vezes suplicante, o drama de cada um: refinanciar o automóvel para obter dinheiro, renegociar dívida, pedir empréstimos, pedir prazo para acertar algo pendente em prazo vencido, com os juros correndo… É preciso ainda enfrentar um processo burocrático inexorável. As relações nesse cenário são sempre discretas e intercomunicadas em voz baixa.

Não é à toa que os gerentes e funcionários destacados para atender a esses casos se sintam como improvisados analistas da alma humana, para ouvir com educação, acalmar, pedir um copo de água. Suas mentes, como a dos psicólogos ou padres no confessionário, ficam “sobrecarregadas” dessa carga de uma infinidade de dramas particulares. Por isso, toda agência deve ter sua farmacinha de analgésicos.

Como a lógica bancária não é praticar caridade e seu objetivo prioritário é garantir a lucratividade, por mais que [os bancos] invistam em tornar o ambiente de atendimento o mais confortável possível [existem em localidades mais luxuosas unidades  que mais se parecem com butiques], com ar condicionado, mobiliário e plantas ornamentais, não são capazes de fazer os milagres desejados pelos seus clientes aflitos. Assim, todos os dias, depois que conseguem ultrapassar as portas giratórias, tem início um relacionamento cujo desfecho nem sempre é agradável.

A propaganda dos bancos, privados ou públicos, procura incutir na mente das pessoas seus aspectos de anjos protetores, prontos para resolver os problemas humanos, de modo suave e sem dor. Mas a realidade nua e crua é diferente.

O problema, na realidade, não são os bancos, mas a forma como a economia se organiza e que, por incompetência ou ideologia política, mantém uma injusta e crônica perversa distribuição de renda. Vale repetir que esse processo tem uma característica anárquica, já que tudo no Brasil “se deixa acontecer”.

Carlos Rossini é sociólogo

é editor de vitrine online

 

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.