TODOS PODEM SER VÍTIMAS – PRECONCEITO É FRUTO DA IGNORÂNCIA
Preconceito é ideia, opinião ou sentimento – favorável ou desfavorável – formado em nossas mentes, antes que tenhamos conhecimento, ponderação ou refletido sobre determinado assunto. É algo que ocorre ou é concebido de forma irracional. Na sua versão desfavorável, produz comportamentos insensatos, intolerância, hostilidade, repulsa, sem nenhum fundamento objetivo, real ou científico. Preconceito, numa palavra, é pensamento ou atitude baseado na ignorância.
Como forma de ação ou reação a tudo que é desconhecido e estranho para nós, gera sofrimentos e mortes. Há uma variedade de preconceitos sociais, raciais, sexuais e culturais. Em grande escala, foram mortos milhões de judeus e outras vítimas do racismo nazista, por serem como eles mesmos, mas diferentes de seus algozes, isto é, raça inferior que precisava ser eliminada. Do mesmo modo foram tratados os escravos, retirados à força de suas terras africanas e trazidos para a América para servirem de objetos de produção econômica, cujos reflexos, em termos de preconceito, se verificam até hoje. Foram estigmatizados culturalmente como seres inferiores por uma ideologia formatada pelos proprietários de terras e seus exploradores, com o beneplácito do estado.
A libertação dos escravos, aqui como nos Estados Unidos, terá surgido pela necessidade de criação de mercados, mas não evitou tanto sofrimento e mortes, até os dias atuais, em que se veem policiais (agindo no sentido mais puro e estereotipado de preconceito) brutalizando ou matando friamente um jovem ou adulto negro. Uma negra que se recusou a se levantar de um banco de ônibus para dar lugar a um branco (havia outros bancos vazios) virou símbolo da campanha antirracista naquele país. A queda do apartheid na África do Sul, simbolizada na figura carismática de Nelson Mandela, possibilitou a criação de uma das mais progressistas constituições [de direitos humanos] já vista.
NAS PEQUENAS PAISAGENS
Sabe-se que uma criança, se, ao nascer, é tratada sem que receba influência preconceituosa, ela se comportará de forma respeitosa, concebendo os outros como apenas diferentes fisicamente, mas iguais em sua essência humana. Já viram uma criancinha brincar com os animais ou com objetos. Ela não tem preconceito algum que, infelizmente, será formado em seu processo de socialização (educação social que modelará sua personalidade). Agora, os adultos são preconceituosos – com raríssimas exceções – sobretudo por terem consciência superficial das coisas e agirem na maioria das vezes de forma automática. Perguntas: o que você sente quando vê um/a negro/a ou pardo/a, um portador de deficiência física, um rico, um pobre, um favelado ou favela, uma torcida adversária do seu time de futebol, um alcoólatra, um viciado, um policial, uma pessoa que segue uma religião diferente da sua, um idoso, uma pessoa com transtornos mentais, um/a homossexual? Como as corporações policiais tratam as pessoas, dependendo de suas características físicas, do modo como estão vestidas ou sinais de riqueza ou pobreza? Como são os casamentos de ricos e pobres, assim como a alimentação, tratamento de saúde, educação e assim por diante?
Reflitamos um pouco mais nas miudezas, porque somos atores e representamos diversos papéis filtrados pelos nossos preconceitos. Um carro vai à sua frente. Ser for uma lata-velha antiga, que roda devagar, você tem vontade de passar por cima? E se for um Mercedez Benz ou um Porsche, você se sente diminuído e, incapaz de ultrapassá-lo, além da sensação de vergonha de sua propriedade ser menor do que a do outro e segue disciplinadamente atrás? E o ciúme, a cobiça, a inveja, a ambição, em que medida alimentam seus preconceitos no dia a dia, sem que tenha consciência disso?
E o que dizer do preconceitos em relação a pessoas famosas [artistas, políticos, empresários] e do modo como são retratadas pela imprensa que, refletindo a própria valoração da sociedade, dá sempre maiores destaques aos famosos que atraem a curiosidade pública, como foram os casos recentes envolvendo a jornalista e apresentadora da TV Globo, Maria Júlia Coutinho (Maju), 37, cuja repercussão levou a polícia a identificar quatro grupos de pessoas suspeitas de cometer esse crime no Facebook, ao postar ameaças e ofensas racistas, incluindo um adolescente de dezesseis anos. Houve uma grande manifestação de solidariedade a Maju. O mesmo aconteceu com a atriz Taís Bianca Araújo, 37, atriz, modelo e apresentadora da TV Globo e jogadores de futebol. Todos esses casos por preconceito de cor. Em uma entrevista recente na TV, o ex-presidente do Superior Tribunal Federal, ministro Joaquim Barbosa, admitiu ter sido chamado de “macaco”. Um homem culto, inteligente, poliglota! Imagine o que acontece com as pessoas humildes desse país!
Acredite, ninguém está sozinho nesse complexo problema humano. Somos misteriosos e estranhos por nós mesmos, isto é, ignoramos quem somos e quantos não alimentam autopreconceitos se depreciando sem que haja um motivo real para tanto? Somos um composto dinâmico formado pela mente, intelecto e corpo e estamos sujeitos a alterações mentais e fisiológicas que contribuem fortemente para nosso estar e nosso relacionar conosco e com o mundo.
As cenas de preconceito acontecem o tempo todo e nem nos damos a devida conta disso. Há preconceitos de natureza profunda ou então como explicar que alguém possa sentir aversão de alguém, logo na primeira vez que o vê? O outro é o não eu e, portanto, diferente de mim e então desperta sentimentos estranhos em nós. O preconceito também habita o mundo do inconsciente dos seres individuais e de toda a coletividade humana na forma de arquétipos ou estereótipos, estruturas que estão muito além do nosso alcance mental ordinário.
MUDANÇAS SÃO POSSÍVEIS
No momento cultural em que nos encontramos dá para notar que houve, indisfarçavelmente, uma evolução na humanidade. O preconceito era muito mais cruel e mortal, podemos imaginar, por que havia muito mais ignorância, isso parece lógico. Mas há um atraso cultural notório no comportamento das sociedades atuais e crueldades que sinalizam até aonde vai a maldade humana, por exemplo, em nome de uma crença. O Estado Islâmico tem cometido assassinatos e violências de toda ordem inconcebíveis para um terceiro milênio – em nome de querer impor um estado a qualquer preço. Tem levado a morte e o pânico não apenas em Paris, como aconteceu recentemente com muitos mortos impiedosamente. Quem concebe uma religião que vive da morte, da tortura e do fanatismo? Mas, pela lei da dialética, o EI está produzindo sua própria destruição e isso será inexorável. Só uma questão de tempo, pois o mundo não pode suportar a expansão desse estado de coisas.
Teria sido alguma espécie de preconceito, de que o mais importante é o progresso e dane-se a natureza – talvez mais mito que preconceito – que teria levado à humanidade (e o risco está de pé) a produzir a própria extinção? Foi preciso centenas de anos para que se fizesse o que está sendo chamado do melhor acordo e sem precedentes já feito em torno da proteção do clima na terra, pelos 195 países que participaram do evento promovido pela ONU. Em Paris [30.11.2015 – 12.12.2015] realizou-se a Conferência das Partes – COP 21 e terá sido [é preciso haver aplicação e resultados concretos] cujo objetivo central é frear o aquecimento global da terra. Esse resultado é fruto do conhecimento – e não mais do preconceito ou ignorância – de que é preciso tomar providências a fim de salvar o mundo de uma catástrofe já anunciada, com o derretimento dos gelos polares, aumento do nível dos oceanos e até mesmo alteração no movimento de rotação da terra.
Muitas vezes na história da humanidade foram momentos cruciais que despertaram para a necessidade de mudanças pela ação da inteligência humana. Assim, nasceu a Declaração Universal dos Direitos Humanos [isso significa que preconceito é crime], após a grande dor com milhões de mortos durante a Segunda Guerra Mundial.
O que se acredita hoje é que mudanças – para superação de todas formas de preconceitos e de comportamento não éticos e imorais, no caso da política brasileira – devem partir de movimentos sociais, a fim de que sejam concretizadas. Será exatamente o despertar dessa consciência e uma forma compartilhada de ações [hoje completamente possível pela internet] substantivas, num avanço necessário e decisivo para que a sociedade possa dar mais passos em direção à luz dos conhecimentos. Conhecimento é o melhor antídoto contra o preconceito. (C.R.)
FIQUE LIGADO
PRECONCEITO SERÁ O TEMA DO PROGRAMA “O REPÓRTER DA CIDADE”, APRESENTADO PELO JORNALISTA CARLOS ROSSINI NESTA QUARTA-FEIRA, DIA 16, NA TV IBIÚNA (www.tvibiúna.con.br), AO VIVO, A PARTIR DAS 19 HORAS.