ENSAIO – O QUE FAÇO AGORA QUE NINGUÉM ME APLAUDE?
Quando nascemos, somos fragílimos e, ao mesmo tempo, o centro do mundo, de atenções e cuidados. Somos amados, queridos, alvo de carinhos continuados. Somos também motivo de felicidade de nossos pais, uma realização essencial para eles. Esses são os momentos mais importantes e decisivos na nossa constituição emocional. Nesses primeiros tempos de nossas vidas se constituem as estruturas que nos vão sustentar pelo resto da vida e definir mesmo sobre nosso destino.
Somos a composição de múltiplos fatores: recebemos a herança genética do casamento biológico de nossos pais, de suas características psicológicas, de seus afetos mútuos, da força de seu amor, das condições e circunstâncias em que se deu o início do relacionamento entre ambos, das influências de suas próprias origens parentais, de suas condições econômicas, de sua cultura e de seus modos de perceber o mundo – o que ele é e como funciona.
Bem sabemos que nem tudo são flores, que há espinhos que nos ferem, que a coexistência de um casal tem altos e baixos, que as químicas de amor iniciais podem inesperadamente se repelir, que os relacionamentos podem ser perfumados, mas conter gotas amargas ocultas, sob uma capa superficial de imaturidade.
Cada homem e cada mulher são únicos e diferentes uns dos outros, a partir das próprias peculiaridades naturais. O papel da mulher na geração da vida, por si só, jamais poderá ser compreendida em sua integridade pelo homem, porque o que ela passa, ansiedades, dores, transformações físicas e químicas a transforma notavelmente. A mulher antes e depois de ser mãe.
O homem, ainda considerando resíduos de uma tradição milenar, como guerreiro, conquistador, responsável pela manutenção do lar não raro e especialmente na atualidade ou se encontra sob ameaça constante de perder sua função fundamental de provedor ou já terá sido retirado dela. Hoje no Brasil depois de uma sucessão de governos irresponsáveis contam-se mais de doze milhões de desempregados.
Essa miserável condição pode fazê-lo sentir-se de tal forma impotente que perde o sentido da vida e procura ocultar tristezas e depressões geradoras de uma diversidade de enfermidades de origem socioeconômica fundadas na culpa e autocomiseração, sem que, de fato, sejam culpados por uma sociedade que se engana e é enganada por uma estrutura de poder [Estado, governo] incapaz de exercer suas funções com eficácia.
Num mundo assim, de incertezas, os atores sociais são levados como rolhas nas ondas do mar, de um lado para outro, e, naturalmente, se sentem perdidos e nem podia ser diferente. Homens e mulheres, uni-vos por meio do amor simples e verdadeiro, capaz de fazer ver o destino comum de todos nós.
Nesse contexto volúvel e incerto, cada um se vê jogado ao sabor da própria sorte num mundo desalmado. Sim, depois dos carinhos essenciais em nossos nascimentos, primeiros meses e anos de vida, a dura realidade vai se apresentando sob a forma de impiedosas e muitas vezes injustas provocações. Nos tornamos presas [fáceis?] de situações desumanas e mesmo cruéis. Chegamos, enfim, ao monumental desafio que nos aguardava desde o nosso nascimento: conseguir ser si mesmo, apesar de todas as adversidades.
Nesse exato momento surge uma pergunta que não se cala: O que eu faço agora que não há ninguém para me proteger e me aplaudir? Aí, caríssimos, começa sua verdadeira história sem as ilusões que o acompanharam até agora. É a chamada hora da verdade. Eu diante de mim mesmo, quer esteja dormindo ou em vigília fazendo diversas coisas – estudos, trabalho, relacionamentos sociais, etc. Ao que tudo indica: seu compromisso número 1 agora é ser livre, autônomo e responsável por si mesmo.
A diferença parece estar no caminho que seguimos quando nos vemos diante de uma bifurcação em estradas ermas. Uma leva para a aventura da maturidade; outra leva para a terra dos sonhos infantis que desejam persistir como se nossa vida fosse eterna. (C.R.)