TARADO DO ÔNIBUS – ATO FOI ASQUEROSO, MAS JUIZ AGIU DE ACORDO COM A LEI  

Muitas pessoas me questionaram sobre a minha opinião acerca do episódio ocorrido dia 30 de agosto de 2017 na cidade de São Paulo em que um homem que ejaculou na saia de uma passageira no interior do ônibus e foi solto pelo juiz José Eugênio do Amaral Souza Neto.

Espero que, ao final deste artigo, não me digam se a igual conclusão eu chegaria caso a vítima tivesse sido minha filha, pois se fosse, estaria agora escrevendo outro artigo, mas seria referente a revisão da pena de morte no Brasil.

É um tema polêmico, com grande repercussão nacional e que divide opiniões, mas a minha interpretação do caso será puramente técnica, à luz da legislação penal.

O juiz que soltou o autor, com o aval do Ministério Público, agiu de acordo com a legislação, pois a conduta por ele perpetrada não se enquadra no crime de estupro (artigo 213 do Código Penal), mas sim na contravenção penal de importunação ofensiva ao pudor prevista no artigo 61 do Decreto-Lei n.º 3.688/41.

Mas, por quê?

O crime de estupro, como é sabido pelos operadores do direito, consiste em constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso.

De acordo com o noticiado, não houve relato de violência ou grave ameaça exercida pelo homem contra a vítima que, segundo consta, estava dormindo e, portanto, sequer havia percebido o ato de masturbação e, por mais que tivesse, também não seria suficiente para configurar o crime de estupro em razão da ausência de ato violento.

Veja-se também que não houve constrangimento no sentido próprio conferido ao delito questionado, que é obrigar alguém à prática de ato de libidinagem, não no sentido usual, de situação vexatória ou embaraçosa.

De fato, a conduta do rapaz é moralmente reprovável, repugnante, asquerosa, desumana, desrespeitosa e que submete a pessoa vitimada a um evidente vexame, mas não pode ser tomada na significação específica que lhe confere a lei penal relativa ao estupro.

Assim, em razão da ausência de violência (emprego de força física para impedir a reação) ou grave ameaça (promessa de um mal grave, como matar ou ferir) para se masturbar contemplando a vítima e a constranger a permitir que nela ejaculasse, não podemos falar na ocorrência de crime de estupro.

Por outro lado, no sábado, 2 de setembro, como foi noticiado pela imprensa, o indivíduo foi novamente preso pelo mesmo motivo, porém, desta vez, usou de força física para impedir que a vítima fugisse dele, ou seja, usou da violência e, dessa forma, configurado está o crime de estupro em razão do emprego de força física e a prisão do cidadão está correta.

Assim, em relação ao primeiro episódio, o juiz apenas fez cumprir a lei e, como se sabe, não pode ceder ao clamor popular para deixar de cumpri-la, até porque o julgador não é representante do povo e não deve prestar contas políticas, devendo apenas prestar contas sobre sua atuação perante a lei.

Assim, em que pesem as vozes dos “juízes do facebook”, os quais não são dotados de formação jurídica, a conduta do magistrado foi de acordo com a Lei.

Autor – Dr. Neto Atui é advogado criminalista.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.

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