RIO DE JANEIRO – OS RISCOS DE UMA INTERVENÇÃO INÉDITA NO BRASIL

Talvez não haja um único brasileiro do bem desfavorável a que se ponha fim à extrema violência fora de controle que tomou conta do Rio de Janeiro, provocando milhares de mortes de inocentes, entre as quais diversas crianças, em confrontos com a polícia ou com facções rivais e assaltos, tendo como pano de fundo um poderoso esquema de tráfico de drogas e de armas altamente destrutivas.

É óbvio que Pezão, governador do Estado em que se encontra a “Cidade Maravilhosa”, um caradura da política, se mostrou incapaz não apenas de combater a violência com eficácia, mas também na gestão pública, deixando de pagar os servidores, mesmo tendo eliminado milhares deles e vivendo do socorro do Governo Federal.

Ele teve a cara de pau, ainda em Brasília, durante entrevista, de dizer que não estava se sentindo diminuído com a decisão do presidente da República de decretar a intervenção do Exército para, com todas as prerrogativas, comandar as ações visando combater um estado de insegurança pública calamitoso e nefasto tanto para a população local quanto turistas.

O fato é que no cenário político e econômico pautado por atos de corrupção devastadores para o Estado (vide seus protagonistas Sérgio Cabral, Anthony Garotinho e companhia) a desmoralização chegou a tal ponto que de fato se instalou um clima de desordem irreparável. Daí a intervenção, sob o argumento de que é preciso garantir o restabelecimento da lei e da ordem, de acordo com os termos repetidos pelo ministro da Defesa, Raul Jungman, também em entrevista em Brasília.

PERIGOS À VISTA

Os inúmeros comentários e debates sobretudo na mídia eletrônica citaram repetidas vezes a palavra “inteligência”, ou seja, como serão enfrentados os desafios extremamente complexos – e até o momento ninguém sabe o que exatamente será feito para combater a criminalidade numa geografia que abrange imensas comunidades que se estendem das encostas ao cumes de morros, com corredores estreitos, longas escadarias, becos, vielas e uma densidade de habitações que mais se parecem florestas onde os bandidos se refugiam garantidos, seja pela conivência dos locais, respeito, gratidão ou mesmo temor, pois a vida por ali parece coisa muito barata.

Há na realidade muitos fatores a serem encarados. Até que ponto as corporações policiais do Estado do Rio de Janeiro – Polícia Militar, Polícia Civil, principalmente – se engajarão de modo abnegado à nobre causa de garantir segurança à população? Como agirá o general-interventor, que supostamente precisa de um poder até mesmo carismático, para obter esse engajamento efetivo, sem que haja sabotagem aos planos a serem seguidos? Qual será a reação da bandidagem armada até dentes com armas de alto poder destrutivo em relação à população que ficará como recheio de um sanduíche, entre as autoridades e os criminosos? O que as facções, se forem reprimidas de modo intenso e radical, farão para se proteger? Irão se refugiar temporariamente em outros estados, como São Paulo, Espírito Santos, Minas Gerais, para citar alguns mais próximos? Será que a população desarmada será utilizada como escudo pelos criminosos? Que consequências terá a repressão, supostamente mais intensa, ao tráfico de drogas?

Outras indagações podem ser sugeridas pois estará constituída uma situação dialética extrema, a exigir uma força e um poder estratégicos talvez mais difíceis de serem colocados em prática do que em uma guerra em que os inimigos são visíveis e menos disfarçados. Se houver uma definição de combate como se tratasse de uma guerrilha urbana, será que isso resultaria em conquistas substantivas?

Estamos, todos os brasileiros, perplexos com a grave situação do Estado do Rio de Janeiro. É preciso lembrar, no entanto, que a violência de semelhante gravidade grassa em outros estados brasileiros por conta de um poder paralelo que se estabeleceu a partir da formação de facções capazes de mobilizar ações coordenadas mesmo dentro de prisões de segurança máxima, haja vista os banhos de sangue e a barbárie do que ocorreu em algumas prisões no Brasil.

Por último, mas não menos importante, é sabida a situação de miserabilidade moral da administração do próprio Governo Federal, obcecado com a Reforma da Previdência (razão por que o decreto da intervenção do Estado do Rio de Janeiro pode ser suspenso, caso haja (os aliados do governo) chegado ao quórum suficiente para aprova-la – e isso mais se parece com uma piada sem graça].

Em suma, as dezenas de milhões de outros brasileiros continuam pagando o preço do desgoverno que, entre outras consequências, mantém um quadro humilhante de milhões de desempregados, sem assistência médica digna desse nome, uma juventude sem mercado de trabalho, ainda sob nuvens sombrias criadas por escândalos e corrupção que destroem a possibilidade de cultivarmos um amor à pátria que brota do coração.

Com todas as restrições e ressalvas descritas acima, torcemos para que a “inteligência” do general Braga Neto seja iluminada e que seus comandados o ajude nessa tarefa pelo bem do Rio de Janeiro e de todo o Brasil. (Carlos Rossini)

 

 

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.

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