SE ENTREGOU – JOÃO USOU O NOME DE DEUS PARA COMETER CRIMES SEXUAIS EM SÉRIE 

Em uma cidadezinha no interior dos Estados Unidos havia um médico ginecologista. Isso já faz muito tempo e não é difícil imaginar que se tratava de uma venerável autoridade local, único a exercer essa função.

A ignorância cultural típica de provincianos e a ciência médica era hermética para os cidadãos comuns.

Durante muitos anos seus procedimentos no consultório eram inacessíveis, segredos que ficavam restritos entre as quatro paredes da sala de exames. Só o médico e a paciente e ninguém mais.

Um dia a casa caiu. Uma heroína se rebelou e denunciou o médico por atos libidinosos com as pacientes. Em comum com o médium João de Deus, que se entregou à polícia neste domingo (16) em Abadiânia, cidadezinha no interior de Goiás, ele também se vestia de branco e os abusos sexuais que cometeu contra centenas de mulheres.

A denúncia se espalhou como um rastilho de pólvora e o medo que calou tantas mulheres por temor de serem humilhadas ou mesmo de perder seus maridos e namorados se dissolveu, foi preso.

O ex-médico Roger Abdelmassih [especialista em reprodução humana] também abusou de muitas mulheres e foi preso. Usava uma sala do seu consultório no Ibirapuera, em São Paulo, aplicava uma droga e estuprava mulheres sedadas. Mulheres abusadas por ele estão manifestando apoio às vítimas de João de Deus.

Agora que um líder religioso, cuja fama de realizar milagres em relação a muitas enfermidades, mesmo doenças incuráveis, como o câncer, atraía multidões tanto de vários estados brasileiros como de países no exterior, a cena se repete. Mais de trezentas mulheres, incluindo sua filha, denunciaram serem vítimas de estupros e outros atos libidinosos.

A aura de curador armou João de Deus de um poder “inquestionável”. Homens e mulheres agiam como que hipnotizados e subjugados pelos seus poderes atribuídos a espíritos de cura. Essas pessoas, de alguma forma, estavam em condição de vulnerabilidade, sejam adolescentes ou mulheres adultas.

Uma mulher confessa que ficou grávida do João de Deus e que abortou por um medicamento fornecido pelo curador. A própria filha dele confessou ter sido sua vítima e o classificou de “monstro”, conforme publica a revista Veja. Há notícia também de uma mulher, que não suportando a depressão por causa do abuso sexual sofrido, foi a óbito. Ademais, não é provável que mais de 300 mulheres tenham inventado essa história.

Forçar alguém a qualquer ato sexual, mesmo que não seja consumada a penetração, é crime grave, sobretudo quando envolve vulneráveis. João de Deus, submetido a uma junta de psicólogos e psiquiatras competentes, certamente revelará desejos perversos de sentir prazer e alguma psicopatologia considerável, o que não o exime de seus crimes.

A partir de agora, João de Deus poderá ser chamado de João do Diabo. Sua trajetória chegou ao fim em meio à uma execração pública que carregará como estigma pelo resto de vida. Um dos seus assessores por mais de vinte anos disse nunca ter visto o médium com um rosto tão assustado quando as denúncias atingiram seu pequeno império como um tsunami.

Quando um fato alcança uma dimensão dessa proporção afeta toda a sociedade brasileira e também centenas de países, deveria servir para alertar, sobretudo as mulheres, a não se deixarem enganar por nenhum tipo de crápula, pois existem muitos que agem nas sombras, enganam, iludem, até que a vítima caia em sua armadilha e é seviciada.

Abusos e estupros de mulheres e vulneráveis podem acontecer a qualquer hora e lugar, enquanto homens criminosos, tarados, bestas feras, animais dominados por hormônios incontroláveis, encontrarem uma oportunidade favorável e se sentirem a salvo de riscos de serem flagrados, enfrentados e presos. E, claro, a Justiça funcionar com todo rigor, sem saidinhas e decretação de liberdade para criminosos que, nesse plano, de acordo com psiquiatras forenses, são irrecuperáveis. (C.R.)

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.

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