A CAMINHO DA PRIMAVERA

É por esse caminho que vou seguir para encontrar a Primavera. É simples, como se vê, mas é o meu caminho. Talvez não encontre nada, se me mover com a mente cética de um Pirro, talvez encontre as flores, muitas flores, e, aí sim, tudo estará bem. Ficarei assim, mais uma vez, em paz com a Natureza, mesmo que seja por um milésimo de segundo. Mas será bom enquanto durar, como diria Vinicius em um dos seus poemas de amor.

A travessia do inverno já está se concluindo e no ciclo ao qual estamos tão habituados prosseguirá com a estação das flores. O que poderá haver de diferente, se tudo continuar igual dentro de mim? Por uma razão ou outra, passar alheio ao festival de cores e dos aromas que se espalham pelo ar, alguns muito sutis, penso ser um procedimento obtuso.

Não é preciso que haja razão alguma para que a Primavera venha e seja bem-vinda. A Primavera é o primeiro verão, a estação em que se anunciam as primícias, os primeiros frutos, é resultado da fecundação que ocorreu silenciosamente no inverno em todos os invisíveis gestos de amores correspondidos.

É por isso que seguirei esse caminho salpicado dessas florezinhas que cobrem o gramado e o caminho, caídas como gotas da copa da sibipiruna às centenas, que voam sopradas pelo vento, enquanto o colibri dá os últimos retoques no pequenino ninho que constrói pendurado num ramo de samambaia. Esse pequeníssimo ser alado que passa diante do nariz em velocidade supersônica…zuuuuuuuuuuummmmmmm! Puro encantamento.

Sei que vai pintar a Primavera no Facebook, e isso também será bom, mas cá, entre nós, se você achar que o que vê na tela é a Primavera estará tendo uma percepção artificial da Natureza, diante de uma ilusão, porque a Primavera é a estação que nos convida para sairmos de nós, irmos para fora e celebrar a vida como fenômeno inexplicável, mas fascinante, para nos extasiarmos com as miríades de cores, que também são uma ilusão, mas de outra espécie, daquela que nos leva direto ao grande mistério de onde tudo isso vem, assim como nós pessoas, e para onde vamos. Assim como as folhas e as flores que se abrem para, em seguida, fenecerem e serem reabsorvidas pela terra e voltarem em outra ocasião em outro agrupamento de átomos que poderão lhes dar outra coloração ou mesmo nova forma. Quem sabe?

Por isso, vou seguir esse caminho dourado pelas singelas pétalas que me abrem os olhos para esse acontecimento exuberante chamado Primavera. (C.R.)

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.