EDITORIAL – COMÉRCIO TERÁ PROTEÇÃO, MAS PRECISA REFLETIR SOBRE A IMPIEDOSA LÓGICA DO CAPITALISMO

Na audiência pública realizada na Câmara Municipal de Ibiúna no dia 8 de agosto, com o objetivo de criar normas visando regulamentar a realização de feiras itinerantes, comércio de ambulantes e outros “eventos que envolvam a comercialização de mercadorias” no município, ficou decidido que será consolidada uma minuta de pré-projeto com essa finalidade, elaborada com a participação do setor jurídico da prefeitura e da Associação Comercial e Empresarial de Ibiúna. O documento, então, deverá ser encaminhado à apreciação do Legislativo.

A necessidade dessa medida se patenteou durante e depois da realização da 1ª FestMalhas [veja matéria exclusiva publicada por vitrine online], uma feira itinerante que contou com a participação de mais de cem barracas, realizada de 18 a 27 de julho, no km 68,5 da Rodovia Bunjiro Nakao, próximo à entrada da cidade. Manifestando a revolta dos comerciantes locais, a entidade que os representa, assim como empresários agindo individualmente, tentou todas as medidas cabíveis para impedir o funcionamento da feira, em vão. Os promotores do evento funcionaram [e tiveram sucesso, segundo um dos seus diretores – “nós temos preço e variedade”, disse à vitrine online] garantidos por uma liminar. Aparentemente, essa iniciativa encontra-se sob o guarda-chuva constitucional que garante o livre comércio e a liberdade de escolha dos consumidores.

Já em 2013 havia sido protocolado um projeto de lei na Câmara que foi retirado da pauta devido exatamente ao fato de ferir a Constituição; em maio de 2014 foi apresentado outro, também retirado para estudo. Constitucionalmente, portanto, a situação se encontra diante de um impasse, mas como a reivindicação dos comerciantes foi considerada justa por todos os vereadores que se manifestaram, já que geram empregos locais, pagam taxas e impostos e contribuem com diversas iniciativas de caráter social, novas medidas serão tomadas.

Assim, a minuta do projeto de lei deverá conter-se dentro dos limites constitucionais e criar regras capazes de impedir situações de privilégios imprevistos, pois “a feira passa, vai embora, leva nosso dinheiro e nós ficamos aqui”.

As medidas de proteção econômica são tomadas até mesmo por grandes potências econômicas mundiais, como os Estados Unidos. Assim, nada que possa envergonhar ou mostrar fraqueza. Mas é oportuno lembrar que a lógica original do capitalismo é impiedosa, desde que as guildas desapareceram após a Idade Média, com o avanço e o acúmulo do capital. Uma nova loja está sendo inaugurada na cidade, pertencente a uma grande rede de varejo, já sinalizando que está aberto o caminho para uma mudança no perfil do tradicional comércio ibiunense. Ainda há pouco, um supermercado dobrou sua capacidade do estacionamento e ampliou sua área de vendas e fica cada vez mais difícil fazer compras ali, tal é o volume de clientes e de veículos. Os tempos são outros e mais velozes.

Aos comerciantes instituídos, na medida em que existe uma associação de classe, cabe dar início a um processo de reflexão, criatividade e de comunicação inovadora, a fim de se despertar para a necessidade de fortalecer toda a categoria. Assim poderão, em linguagem econômica atualizada, fazer frente às ameaças que fazem parte do jogo do comércio e da livre concorrência.

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.