CRÔNICA – QUANDO CHEGUEI À ESTAÇÃO, O TREM JÁ HAVIA PARTIDO
Cheguei atrasado à estação, quando o trem já havia partido. Vi-me só na plataforma vazia. Os guichês estavam fechados, assim como a cafeteria e todas as outras portas. Nem mesmo vestígio de fuligem podia ser sentido no ar. Resignado com a situação, senti o embaraço de não ter o que fazer. Dirigi-me a um banco encostado na parede e ali me sentei. Daí para a frente teve início um imaginar sem fim.
Talvez houvesse um quadro de aviso sobre os próximos horários, por isso levantei-me rapidamente e caminhei até o local dos guichês. Ali estava fixado um aviso: “Próximo trem daqui a 100 anos.” Não pude levar isso a sério, mas não havia pessoa alguma com quem poderia expor minha incredulidade, diante do que considerei um absurdo.
Retornei ao banco de madeira já com a cor desbotada, sentei-me novamente e mirei meus olhos para a estação em si. Logo me espantei porque do lado oposto não havia plataforma alguma. Por óbvio, concluí que só havia trem de ida, mas não de volta. Um sentimento de horror se instalou dentro de mim por um instante.
Primeiro, aquela coisa de próximo trem daqui a 100 anos; agora, essa de uma linha só de ida. Como as pessoas poderiam voltar? Estava contrariado, mas não havia ninguém com quem compartilhar minha perplexidade. Foi, então, mais sensível e em completo silêncio, que intuí que o trem vinha de muito longe e seguia para um lugar muito distante. Um arrepio congelou meu corpo ao descobrir, atônito, que certamente essa linha não tinha começo e tampouco fim. Portanto, deduzi, que, na verdade, o trem só se movimentava sem nunca chegar.
Esforcei-me para verificar se estava sonhando e, sim, era apenas isto, um sonho, em que não há lógica perceptível, mas fragmentos de histórias que se misturam e depois, acordados, não conseguimos compreender seu significado. Mas, estava acordado e solitário. Será que surgiria um outro retardatário, outro passageiro com quem ao menos pudesse conversar?
Mas, ninguém surgiu, o que me fez compreender que teria que permanecer ali um século. Foi só nesse momento, finalmente, que percebi que algo estranho estava acontecendo. (C.R.)