PERSONA – O MUNDO COLORIDO PELAS OBRAS DE ENRIQUE ARAVENA

Enrique Octavio Aravena Bustos, ou Enrique Aravena como assina suas pinturas e desenhos, nasceu no sul do Chile, numa cidade chamada Temuco. Há trinta e sete anos vive em Ibiúna com a família, mulher e dois filhos, numa casa em que se destaca um grande estúdio cujas paredes são cobertas por imagens coloridas e inconfundíveis, desde pequenos quadros a painéis, um dos quais, em andamento, será uma grande homenagem a São Sebastião, santo protetor de Ibiúna. Na foto acima, o autor, em seu estúdio, diante do projeto tríptico “Festa de São Sebastião”.

Antes de abrir a narrativa que ele próprio apresenta não posso excluir um episódio ocorrido há alguns anos protagonizado por Enrique Aravena. O editor de vitrine online apresentava um programa diário em uma webtv em Ibiúna. Aravena havia sido convidado para uma entrevista à noite, por volta das 19 horas.

Sua mulher e filhos chegaram antes dele e ficaram no estúdio aguardando sua chegada. O tempo passa e nada de o artista aparecer. A preocupação tomou conta de todos no estúdio. Onde estaria? Logo pensamos em informar a polícia para saber do seu paradeiro, em meio a justificada aflição.

Sabe-se lá o quê da alma de um artista! Quando já estávamos pensando o pior, eis que o artista aparece, de repente! Alívio geral! E a entrevista começou…

Agora, sim, apresentamos Enrique Aravena.

Fale sobre os seus pais e sobre o lugar de sua infância.

Minha cidade de nascença chama-se Temuco, nome indígena que significa água de temu, planta sagrada dos mapuches, povo natural dessa terra.

Temuco foi o lugar onde os espanhóis levantaram um forte para controlar o povo mapuche. A região ficou sendo fronteira entre ambos povos.

Durante a minha infância meu pai era funcionário de um juizado que cuidava de causas indígenas. Ele mesmo tendo um cargo de secretário, ajudava no possível a indígenas que poderiam ser condenados pelas leis dos brancos, mas que no contexto de suas tradições não seriam culpados. Meu pai era uma pessoa generosa que ajudava a quem podia. Posteriormente obteve um cargo nos Tribunais de justiça de Santiago, em função do qual, a família, eu com 10 anos, mudou-se para a capital.

Quem é Enrique Aravena?

Acima de tudo, um buscador. Motivado pela vida a procurar respostas com a clareza de que no materialismo somente encontraria fuga sempre tive a certeza de no conhecimento achar um reencontro com a fonte que também é nossa própria essência.

Esse continua sendo o meu norte e o que motiva tudo o que faço.

Como nasceu o artista?

De muito pequeno tive facilidade com o desenho, sendo na escola o “menino que desenha bem” da classe.

Qual foi o motivo inicial?

Meu pai, vendo meu interesse no desenho e pintura, acordou comigo que estudasse desenho e fotografia publicitária, pois era mais seguro economicamente. Estudei numa academia e após terminar me empreguei numa fábrica de letreiros e outdoor. Após um tempo comecei junto a ex colegas uma pequena agência de publicidade. No início dos anos 70 Chile vivia uma situação agitada, política e economicamente e a publicidade não era meio de sobrevivência. Passei a trabalhar como desenhista para um amigo que produzia objetos artesanais e daí surgiu uma exposição de obras feitas em cobre repuxado tendo como tema a mitologia de Chiloé, Ilha do Sul do Chile, que teve êxito principalmente com público do exterior. Isso abriu portas para exportar meu trabalho e posteriormente viajar por países de Sul américa.

Há quanto tempo você é pintor? 

Aproximadamente 50 anos. A pintura foi surgindo aos poucos, se firmou mais depois que sai do Chile em 73 e viajei por vários países fazendo artesanato e pintando.

E desenhista?

Em 1970 comecei a desenhar profissionalmente.

Como você vê o mundo?

Vejo-o como uma escola, mas é uma consequência, um reflexo e não uma causa. A causa está na mente que somos. Assim, na medida que mudamos nossa condição interna o externo mudará.

O que é a arte para você?

A poesia que a meu ver é a mãe de todas as artes pode explicar a nível de emoção melhor muitas coisas do que o discurso da razão. O sentimento que nos traz uma música ou uma pintura é único e insubstituível.

Como acontece a inspiração?

A entrega, no caminho espiritual é retribuída como um fluir de experiências cuja finalidade nos leva à confiança, fé e conhecimento. Assim como na vida, no fazer da arte a entrega traz uma sequência intuitiva e orgânica de ações em que o artista inspirado passa a ser um expectador do fazer artístico, dissociado do fazedor sendo mas um instrumento da inspiração.

Que técnica que você utiliza?

Nestes últimos anos tenho usado muito a tinta acrílica aplicada com espátula, mas também uso pincel e tinta óleo.

Você se inspira em algum pintor ou a alguma escola artística?

Costumo dizer que a produção de um artista é como um rio em que há vários afluentes, que são as influencias que formam seu estilo. O artista recebe e transforma isso tudo na sua expressão particular que será autêntica por essa transformação e que será arte na medida em que é autêntica.

Muitos artistas desde a arte moderna a contemporânea têm sido importantes para mim e posso mencionar desde Monet, Chagall, Picasso,  Mondrian, Modigliani, Guayasamín. E brasileiros como Segal, Portinari,  Paulo Pasta, Mohali, Ianelli, Aquila, Granato, Tunga e Cildo Meireles.

Quantas pinturas você já criou em quase meio século de trabalho artístico?

Tive a oportunidade de produzir muitas obras desde as que expunha inicialmente em feiras como a da República ou Embu a as que eram vendidas em Leilões na TV como Ayoub Gallery e outras. Acho que devem ultrapassar as 5000 obras.

Existe alguma diferença, além do tamanho, entre obras de menor dimensão e de grandes dimensões?

Para mim obras pequenas geralmente contém uma história uma mensagem um significado, obras maiores podem conter mais significados ou cenas, mas principalmente tornam a mensagem maior falam mais alto. É a importância de um grande mural em que a monumentalidade cobra um papel fundamental.

Explique sua frase: “Ainda quero fazer o meu melhor, se Deus quiser.”

Após 50 anos no ofício há um acúmulo de prática e conhecimento que pode resultar em uma superação ao já feito. Na medida em que isto seja a vontade de Deus, este é meu desejo.

Quando se mudou para Ibiúna?

Em 1984 escolhi residir em Ibiúna comprando uma chácara perto da cidade. Casei com Helenice em 1994, minha companheira de vida, com quem tenho dois filhos maravilhosos que hoje estão com 12 e 9 anos. A minha família tem sido fonte de alegria e inspiração .

O que acha de Ibiúna?

Enrique Aravena, Helenice e os filhos Rodrigo Alejandro e Artur Enrique

Um bom lugar para viver, tranquilo mesmo perto de São Paulo com uma natureza esplêndida e gente cordial.

Onde, no Brasil e no mundo, se encontram obras suas? 

Muitas obras no Estado de São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Bahia. No exterior predominantemente no México e Estados Unidos más também no Canadá, Alemanha e França.

O que pensa da vida?

Penso que agora, principalmente, temos a oportunidade de repensar nossos objetivos e a nossa forma de viver quando o fruto do nosso pensamento parece não nos trazer paz e que a maturidade vem de objetivar essa paz como consequência de uma sincera introspecção,  livre do entulho dos consensos que mostram sua inutilidade num mundo que certamente vá melhorar, na medida em que cada um cuide de se melhorar individualmente.

Tríptico “O Circo”, obra vendida nos Estados Unidos

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *