ENSAIO – PRECISAMOS DE ‘LUZ’ PARA LIDAR COM A ‘SOMBRA’ QUE VIVE DENTRO DE NÓS

Ninguém foge da própria sombra. Esta frase é tão velhusca quanto verdadeira. A nossa sombra nos segue aonde quer que vamos. Isso acontece na realidade em que caminhamos sob a luz solar.

À noite, nossa sombra fica invisível, mas nem por isso deixa de existir, pois ela está dentro de cada um de nós e é conhecida também como inconsciente, a parte de nós que influencia nossa vida – pensamentos, sentimentos, sensações – mais do que se possamos imaginar.

Esse é o território dos nossos sonhos quando dormimos, o que nos provoca insônias, mal estar, desassossego e toda sorte de desconfortos mentais. Não é à toa que a indústria de fármacos fatura bilhões com a venda de uma variedade de medicamentos para lidar com depressões, angústias, nervosismos, ansiedade e até mesmo pânico.

De modo geral, enquanto a(s) causa(s) dos sintomas não forem percebidas, porque nossa mente não pode ser vista diretamente como os aspectos visíveis do nosso corpo, seus efeitos tendem a permanecer. Pessoas portadoras de alguma modalidade de sofrimento mental precisam de muito respeito e consideração.

Li recentemente o depoimento de um jovem que fora molestado sexualmente em sua infância. O relato, embora breve, revela um estado de transtorno extremamente dolorido. Cabe perguntar, como se sentirá o autor desse ato. Estará se sentindo normal e aproveitando a vida como um predador no reino animal?

Minha amiga psicóloga mais de uma vez me informou que de cada 10 crianças que trata em seu consultório, cerca de 8 são vítimas de abusadores no ambiente familiar, o que põe sob suspeição parentes, vizinhos, amigos que, tendo a oportunidade, investem contra criaturas inocentes e imaturas para avaliar os fatos acontecidos. Muitas guardam para si como se o abuso cometido talvez não tivesse acontecido, embora possa fazer um estrago considerável em sua personalidade.

O que dizer daqueles – políticos, empresários, traficantes, policiais perversos, criminosos de diversos perfis, assassinos, etc. – que cometem uma coorte de crimes hediondos contra a sociedade? Será que não têm uma sombra em seu interior mental? Sim, ninguém vive sem a sua sombra.

Segundo se sabe de pesquisas no campo da psicologia, todos eles de alguma forma pagarão, em algum momento, pelos atos que cometeram. Sabemos qual é o fim de todos eles, ainda que não possamos acompanhar o término de sua história individual no correr do tempo.

Supõe-se que exista nos seres humanos uma entidade poderosa de natureza moral, comparável ao inferno, quando deverão prestar conta do que fizeram em suas vidas. Conta-se que Hitler suicidou ingerindo veneno. Se isso de fato aconteceu, podemos imaginar o momento exato em que estava prestes a engoli-lo?

A questão que se apresenta nesta altura é o tempo em que as pessoas más levam praticando suas maldades pelo mundo e o mal que causam aos outros, antes de que sua história chegue ao fim. Lembro-me, pois sou dessa geração, dos personagens brutais que torturaram e mataram brasileiros depois da chamada Revolução de l964. A maior parte deles já morreu, alguns com enfermidades graves, mas deixou na memória dos brasileiros conscientes uma lembrança de sua fria crueldade, arrancando a vida de muitos jovens idealistas.

Creio, contudo, que eles tiveram seu momento infernal na hora “H”, ao enfrentar a memória daquilo que provocaram nos outros. Não se pode imaginar que alguém capaz de protagonizar maldades se livre de sua própria sombra em nenhum momento, especialmente quando o anjo da morte lhes mostra seu instrumento ceifador.

Desde o momento em que se começou propalar pelo mundo o surgimento da Era do Aquário em cujo epicentro há a esperança do estabelecimento de um período de paz e compreensão entre os homens, vive-se, no coração das pessoas do bem e de amor ao próximo, a esperança de que coisas boas passem a acontecer, antes que um meteoro gigantesco colida com a Terra e a pulverize para que um haja um retorno ao tão sonhado paraíso perdido.

Em suma, precisamos da luz da consciência para lidar com a sombra que vive dentro de nós. (Carlos Rossini é editor de vitrine online)

 

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.

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