EDUCAÇÃO – CONVERSA (FRANCA) COM UM ADOLESCENTE NUM PAÍS IMATURO

O que a sociedade adulta, incluindo a imposição de um padrão tradicional e obsoleto de ensino, tem a oferecer para os adolescentes como modelo e exemplo que, por definição, se encontram num momento da vida em que mais precisam ser compreendidos e respeitados em seus anseios de liberdade?

É preciso acabar com a hipocrisia generalizada de uma sociedade fracassada ética e moralmente, haja vista que o Brasil, nossa pátria, pratica o oposto do que se poderia chamar de valores humanos, ética e moral.

Quantos jovens formados em ensino superior nas mais variadas especialidades se encontram desempregados ou se sujeitando a trabalhos com o único objetivo de sobrevivência, mas não de crescimento profissional e social?

E esse clima demencial de estabelecer exigências esdrúxulas em torno de ideologias restritivas para encabrestar os sonhos de inclinações naturais de cada jovem em seus desejos autênticos.

Salvador Dali, um gênio da humanidade, era um péssimo aluno no sentido tradicional das diretrizes de uma escola. Tudo que ele fazia era desenhar as aulas. Seu senso de autorrealização mais forte dos que as sanções autoritárias da escola – e tivemos aqui mesmo a palmatória, para castigar fisicamente os alunos – felizmente ultrapassou a mediocridade do ensino oficial.

Uma coisa que – há exceção, graças a Deus – a docência castrada parece não entender. Há matérias que são causa de transtornos mentais nos alunos, ainda que para outros sejam atraentes. Matemática, por exemplo. Quem poderia ensinar matemática ou geometria para Salvador Dali se ele já tinha todo o conhecimento necessário de estética dentro de si.

O que as escolas, sobretudo as públicas, estão ensinando às crianças e adolescentes serve, de fato, para despertar os alunos para a arte da vida real? Se o alvo é formar mão de obra, estão produzindo um exército de reserva inútil. Basta lembrar quantos milhões de brasileiros estão desempregados e o que aguarda aqueles que dependem de futura aposentadoria para garantir sua sobrevivência mínima questionável.

Há um complô tácito de enganarmos uns aos outros, ao fingirmos que estamos realizando nossas tarefas de uma forma tão útil e necessária para a sociedade que muitos até conseguem dormir como ursos em hibernação.

Vivemos como robôs, com a diferença de sermos humanos, movidos pelo medo, insegurança, a fim de garantir nossos salários na conta, como objetivo supremo de todos os nossos esforços.

Por que os adolescentes são rebeldes e procuram alternativas em tribos que precisam construir para sobreviverem ao mundo oficial tão estúpido quanto cínico e irresponsável?

O que tudo isso tem a ver com o consumo de drogas, os suicídios, violência, os conflitos domésticos e o impulso natural dos jovens para se libertarem e terem vida própria em relação aos seus pais, em um processo em andamento que se iniciou logo após seu nascimento, quando ainda não tinham suporte racional para entender o que percebiam em seu entorno.

Esse clima se torna ainda mais desafiador, quando sabemos que precisamos enfrentar os desafios com novas ideias e práticas, não apenas entre nós, mas no mundo todo. De acordo com dados do Unicef – Fundo das Nações Unidas para a Infância, em 2018, cerca de 150 milhões de estudantes entre 13 e 15 anos já foram vítimas de violência por parte de seus colegas. Os episódios de agressão aconteceram dentro e fora do ambiente escolar. Por que a violência é tão evidente e a paz parece andar distante de nossa lembrança?

Quantos, incluindo adultos, não gostariam que o trem parasse para que pudessem descer? O que as escolas têm que causam tanta inquietação na juventude? O que elas significam para os estudantes, além de provocarem preguiça e desânimo?

Por que os professores [que merecem todo o respeito, mas que são reféns de um sistema controlador] são tão mal remunerados e maltratados em nosso país? Isso não reflete a importância que conferimos à cultura como forma de aquisição de conhecimentos e possibilidade real de crescimento individual e de consciência autônoma dos indivíduos jovens?

É preciso acabar com o cinismo oficial e a falta de respeito. É preciso urgente redescobrir o amor como instrumento das relações sociais dentro e fora das salas de aula, na sociedade toda que, aliás, revela um estado de fragmentação, com discursos em que as palavras perdem seus significados e já não conseguem corresponder ao que pensamos, porque também perdemos a capacidade de pensar corretamente.

Até este momento, o andar da carruagem da história brasileira não sabe reconhecer à luz da verdade o tamanho real da nuvem sombria que obscurece a nossa alma e nos retira do foco de que há um futuro a construir a partir dos escombros pegajosos de um país saqueado impiedosamente, desde sua descoberta e que continua sendo, de suas riquezas naturais.

É preciso estudar, sim, é preciso haver limites e disciplina, sim, mas é preciso duvidar até quando continuaremos deitados em um “berço esplêndido”, sem nada fazer para que, como Fênix, possamos ressurgir das próprias cinzas que nos chamuscaram doloridamente.

Estas palavras foram escritas [depois de um diálogo com um adolescente] como tentativa de interpretar sua visão em um país que mal sabe como se governar e ainda nem sequer alcançou sua maturidade política, econômica, ética, moral e cultural. Perdemos ou nunca tivemos uma identidade séria e respeitável. Somos um país descoberto que ainda não se descobriu. (Carlos Rossini é editor de vitrine online)

Carlos Rossini

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.

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